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Cada vez mais casais estão dividindo atividades domésticas

Já faz algum tempo que realizar tarefas domésticas, como lavar a louça, arrumar a cama, cozinhar e cuidar das crianças deixou de ser uma atribuição essencialmente feminina. Hoje, entre os casais, é possível perceber um crescimento da divisão das atividades que envolvem os cuidados com a limpeza e manutenção da casa e a criação dos filhos. Mudanças que, para muitos deles, representam mais união e cooperação, o que também pode ajudar a enfrentar a rotina a dois, que nem sempre é fácil.

Uma pesquisa feita pelo site Restaurante Web mostrou que a maioria das mulheres afirma que cozinhar, escolher o cardápio e fazer as compras são tarefas femininas. Os dados indicam que, para 49% das entrevistadas, cuidar da louça é o que mais afeta o casal e não saber pilotar o fogão é o pior para 29% delas. Já o trabalho “sujo” fica a cargo deles. Para 82%, tirar o lixo é uma tarefa masculina. Eles também ficam responsáveis por colocar a mesa (54%), lavar a louça (70%), tirar e limpar a mesa (53%).

Prestes a completar 25 anos de casados, a funcionária publica aposentada Vanessa Pastorello Tavares, de 59 anos, e o artista plástico Jerlei Saad Barbosa, também de 59, encontraram juntos uma fórmula que faz com que a casa fique arrumada e o casamento siga feliz. “Jerlei sempre foi muito gentil e, desde que nos casamos, ele assumiu as tarefas da casa, ainda mais depois que tive uma depressão profunda e passei a apresentar problemas na coluna”, conta Vanessa.

Em casa, é Jerlei quem comanda as atividades na lavanderia, cozinha e nos demais ambientes. Para Vanessa, especialmente devido ao problema na coluna, resta apenas secar a louça, cozinhar eventualmente e fazer companhia ao marido. “Ele lava roupa, passa, limpa a casa, faz compras, arruma a cama, cozinha e até aprendeu a bordar ponto cruz e costurar. É um marido de ouro”, diz a aposentada. Mas quem pensa que ele sofre ou se sente explorado está enganado! “Fui criado desta forma, sou o único homem dos quatro filhos e cresci ajudando nos afazeres domésticos. Depois, passei pelo Exército, onde adquiri ainda mais disciplina. Em casa, ajudando minha esposa, percebi que a gente conquistou cumplicidade, que, cuidando um do outro, as coisas ficam mais leves e a vida fica mais fácil”, defende o marido.

A empresária Priscila Hildebrando Tchaika, 30, e seu marido, o médico André Tchaika Neto, 40, também dividem as tarefas. Ela é proprietária de um hotel para cães e conta com André para manter a casa e o negócio da família em ordem. “Eu cuido da limpeza da casa e geralmente cozinho, mas meu marido me ajuda muito na cozinha. Ele também me ajuda com os cuidados com os hóspedes caninos, além dos nossos animais, que são vários. E também é um ‘faz tudo’: construiu a lavanderia, um espaço para lazer, as calçadas e o piso dos canis. Trocar lâmpadas e consertar o chuveiro também é com ele”, relata Priscila.

E os exemplos não terminam aí. A motogirl Adriana Regina do Carmo, 29, está grávida de seu segundo filho e conta com a ajuda de seu marido, o motorista Dalioberto Silva Cardoso, 27, para tudo. “Meu marido faz tudo em casa, até a minha roupa ele lava, isso porque eu trabalho 15 horas por dia e ele oito. Ele é quem cuida da casa e, agora que eu estou grávida, a mordomia ficou ainda melhor”, confessa feliz.

A Vanessa, restaram apenas algumas poucas atividades, como enxugar a louça, cozinhar de vez em quando e fazer companhia ao marido, mas Jerlei não se importa. (Brunno Covello)

Modificações no casamento e na sociedade

A psicóloga Vera Maria Carvalho diz que ter consciência da sua parte na construção das rela&ccedil,;ões já não é mais um “problema de gênero” para os casais. “Os casais mais jovens e até mesmo a geração dos pais dos casais jovens, já adotaram uma postura mais participativa nas questões domésticas coletivas. O entendimento sobre viver em conjunto e sobre o casamento se modificou. A consciência é outra, diferente de duas gerações atrás, quando a mulher era ensinada a cuidar da casa e da educação dos filhos e o homem bastava como provedor. Atualmente, temos mais simetria nos papéis”.

E estas mudanças também se refletem em nossa sociedade. “O mundo e a humanidade evoluíram. As relações pessoais e coletivas se redefiniram. Temos outras configurações familiares que vão além do modelo nuclear (pai, mãe e filhos). O modelo machista não serve mais, embora ainda encontremos resquícios desta aprendizagem em alguns homens e mulheres. Precisamos aprender a viver e conviver com os novos interesses, adaptações sociais, políticas e relacionais”, ressalta Vera.

Para o professor do curso de Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) Lindomar Boneti, estas mudanças tiveram início a partir do momento em que a mulher assumiu tarefas e papéis sociais fora do lar. “Hoje, homem e mulher dividem os recursos domésticos de forma compatível e tarefas de casa também tendem a ser divididas desta maneira. Mas este é um processo em evolução, ainda há homens que não fazem nada em casa”. Para que essa situação evolua ainda mais, ele aposta na educação como ferramenta de conscientização. “Este processo, que é positivo, fluiria ainda melhor se houvesse um trabalho educativo na família, se os pais educassem seus filhos sem distinção, sem “tarefas de meninos” ou “serviço de meninas”, assim, as novas gerações podem ser preparadas de forma diferente”.