Investigação no vazio

Casos Rachel e Giovanna ainda sem suspeitos identificados

O assassinato das meninas Giovanna dos Reis Costa, em Quatro Barras, em 2006, e Rachel Maria Lobo de Oliveira Genofre, em 2007, em Curitiba, ambas com 9 anos, tiveram caminhos diferentes, mas ambos estão sem solução, pela investigação deficitária logo depois dos crimes. Os três ciganos que moravam atrás da casa de Giovanna e que foram levados a júri, sob a acusação de ter matado a menina em ritual, foram inocentados por falta de provas. Já o caso de Rachel, encontrada estuprada e morta dentro de uma mala na rodoferroviária, ainda está no vaivém entre delegacia e Ministério Público. Nem virou ação penal.

Depois do júri, o caso de Giovanna dos Reis Costa voltou à polícia para ser investigado e a delegada Araci Carmen Costa, atualmente na Delegacia de Crimes contra a Saúde (Decrisa), foi designada para presidir a continuação do inquérito. Ela não conversou com a reportagem, para dizer se há ou não novidades. Apenas informou por meio de sua secretária que o inquérito está no Ministério Público, com pedido de mais prazo para investigações.

“Esperança não tenho mais. Já passou muito tempo, estamos muito confusos. Estou tentando levar minha vida normalmente de novo. Antes, eu até acreditava que eram mesmo os ciganos que a mataram. Mas depois do júri, nem sei mais o que pensar. A polícia começou a investigação toda errada. Tudo o que passávamos, era ignorado. Nem sei mais em quem acreditar, para onde correr”, disse Cristina Costa, mãe de Giovanna. Depois de oito anos do assassinato e menos de um ano do júri, a mulher sente-se desnorteada e desgastada.

DNA

Cássia Bernardelli, advogada que atua para a família de Rachel, conta que 158 exames de DNA já foram feitos, todos com resultados negativos. Segundo a delegada Maritza Haisi, o inquérito já tem sete volumes que somam 5.700 páginas. “Não chamo de caso insolúvel, porque se fosse, já estaria arquivado. Porém alguns casos são solucionados mais rapidamente, outros demoram”, disse a delegada.

Maritza não se pronuncia sobre o início das investigações do caso Rachel, já que estava nas mãos de outro delegado e, depois, já passou por pelo menos outros dois. Mas para Cássia, o caso Rachel é de difícil solução porque a quantidade de provas perdidas nas primeiras 24 horas de investigação foi muito grande. “Nessa briga para ver quem ia ficar com o caso, já que o crime repercutiu na imprensa, a polícia se perdeu no foco”, avaliou Cássia.

De acordo com a advogada, o cadeado que fechava a mala e uma das sacolas que envolviam o corpo da menina foram perdidos, a mala foi mexida por dezenas de pessoas, entre outras provas técnicas que não foram colhidas no local de crime ou que ficaram contaminadas pelo incorreto manuseio. “Tinha que recomeçar do zero, mas provas iniciais se perderam”, lamentou Cássia, sem muita esperança de ver uma solução.

Cássia também questiona a qualidade do material genético do estuprador coletado dentro do corpo de Rachel. “A perita e o médico-legista me falaram que o líquido encontrado no corpo da Rachel não tinha esperma, provavelmente porque o estuprador já tinha ejaculado outras vezes antes”, comentou. A advogada afirma que outras circunstâncias foram ignoradas. “Rachel frequentava a Biblioteca Pública do Paraná todos os dias. Ela esteve lá no dia do crime, mas ninguém da biblioteca foi ouvido”.

Irmãs

Sem solução também está o caso das irmãs Elizateth e Cecília Nakadaira, mortas e violentadas em 1982, no Campo Comprido. Para ir à escola, elas precisavam cruzar um matagal entre a propriedade de seus avós e a rua. Foram encontradas mortas neste matagal e não chegaram à aula naquele dia. A rua do homicídio até já recebeu o nome delas, em homenagem. Mas o crime já prescreveu e nenhum culp,ado foi apontado. “O padrão de investigação não mudou muito de lá pra cá”, alfinetou o advogado Cláudio Dalledone.

Provas são mais difíceis em homicídios

Danilo Rodrigues Alves, presidente da Associação Paranaense dos Advogados Criminalistas (Apacrimi), comentou que inquéritos mal produzidos geram desperdício de dinheiro público e dos envolvidos e desgaste emocioal a réus e famílias das vítimas.

Tanto Danilo Alves como outros profissionais do Direito acreditam que a falta de estrutura e domínio de novas técnicas científicas e tecnológicas, capazes de produzir provas materiais, faz muitos inquéritos de homicídios se basearem apenas em testemunhos. Boa parte desses inquéritos acaba com réus inocentados no Tribunal, mesmo sendo culpados do crime.

As provas técnicas são laudos de exames que comprovam fatos de forma científica. Estas provas não precisam ser refeitas depois que o inquérito vira ação penal. Uma vez produzidas, são definitivas até o final. Já as provas testemunhais se baseiam apenas no que as pessoas declaram e o inquérito ganha corpo com o cruzamento das informações prestadas por elas. Além de serem ouvidas na delegacia, por lei, elas devem que ser ouvidas novamente na fase processual e no júri.

“Essas pessoas falam uma coisa na delegacia, mas quando chegam na fase de processo ou no júri, já dizem que não é bem aquilo, que não têm certeza e todo o trabalho intelectual que o delegado fez em cima das testemunhas cai por terra”, lamentou um delegado, que preferiu não se identificar. Boa parte das testemunhas muda o discurso, porque foi ameaçada ou outra motivo pessoas. Também, mudam de endereço e podem não ser localizadas para o júri.

Dificuldade

“O homicídio tem um vínculo direto com a prova testemunhal. Não é como tráfico de drogas, receptação ou roubo, que você consegue materializar facilmente. O objetivo é sempre conseguir a prova material, mas em casos de homicídio isso nem sempre é fácil. Em outras situações falta comprometimento de delegado e da equipe, faltam recursos humanos e materiais, faltam recursos especializados. Uma série de fatores influenciam na solução de um crime”, analisou outro delegado, que preferiu o anonimato.

O delegado Cláudio Marques Rolin e Silva, presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia do Paraná (Sidepol), confirma que ainda falta estrutura para trabalhar. Mas também diz que o sindicato tem batalhado muito nos últimos anos para conseguir melhorias e algumas foram conquistadas. “Se conseguirmos a melhoria que pretendemos, será difícil ver um crime não solucionado”, alegou o sindicalista.

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