Entrevista

Beto Richa fala sobre o futuro mandato

Passada a batalha eleitoral, o governador eleito do Paraná, Beto Richa (PSDB) começa a organizar seu futuro mandato. Equipe de transição nomeada e reuniões para a montagem do secretariado ocorrendo diariamente, Beto tem três meses para conhecer a situação do Estado e preparar-se para cumprir suas promessas de campanha. Neste primeiro mês, no entanto, o tucano terá de dividir o tempo com a campanha de José Serra (PSDB) no segundo turno da eleição presidencial, à qual promete dedicar-se de corpo e alma. Em entrevista a O Estado, Beto disse que já quer cumprir os compromissos de aplicar os 12% na saúde, reajustar os salários dos professores e interiorizar o governo no ano que vem. Afirmou, ainda, que Gustavo Fruet (PSDB) e Ricardo Barros (PP) terão espaço em seu governo e deixou claro que sua mulher, Fernanda Richa, só não será secretária se não quiser.

Daniel Caron

O Estado – O senhor prometeu que seu primeiro ato no governo do Estado vai ser “fechar as torneiras”. Já sabe onde enxugar e como fazer isso tendo 14 partidos para abrigar em sua equipe?

Beto Richa –
Com a maior tranquilidade. Vamos fechar as torneiras de gastos supérfluos, desperdícios, melhorar os gastos públicos, rever a questão dos cargos em comissão. Eu vou saber com precisão depois de concluída a transição. O trabalho começa agora, já designei a comissão que vai tratar com a equipe indicada pelo governador Orlando Pessutti para saber a situação do Estado, a situação financeira, a estrutura toda, os gastos. Aí a gente vai poder avaliar onde vamos reduzir e quais as mudanças gerenciais que vamos implantar no Estado. Agora, serão profundas, porque meu estilo é bem diferente do (estilo) dos que estavam aí.

OE – Mesmo sem saber onde, sabe que tem como cortar?

BR – Claro que tem como cortar. Eu assumi a prefeitura de Curitiba, que, em comparação com o governo do Estado, era uma estrutura muito mais enxuta, muito mais redondinha e conseguimos melhorar o que já era bom. Peguei a prefeitura com um pequeno déficit financeiro e consegui superávits sucessivos. Deixei dinheiro em caixa, dando aumentos para os servidores acima da inflação e pagando R$ 60 milhões em precatórias. Transformei a cidade em um canteiro de obras, tudo isso com as portas fechadas do governo do Estado. Prova que dá para fazer. Basta determinação, vontade política e uma boa equipe em todas as áreas. Por exemplo, quando entrei na prefeitura, determinei a redução em 10% nos gastos de custeio. A equipe toda, comprometida, reduziu. E há dois anos, com a crise, determinei a redução em mais 15%. Eles reduziram 18%. Com uma liderança respeitada e uma equipe envolvida, a gente consegue avançar muito, coisa que no governo do Estado a gente sabe que não havia. Em relação aos partidos, eu vou analisar as listas de sugestões dos partidos e vou escolher a dedo. Equipe minha tem meta para cumprir. Não atingiu as metas, não correspondeu às minhas expectativas, não terei a menor dificuldade em desligá-lo da minha equipe. Na prefeitura, troquei mais de 15 secretários. Não posso em função de amizade ou compromisso político prejudicar o andamento do Estado. Vamos buscar profissionalismo na gestão pública.

OE – Nessa sua análise dos nomes vai ter espaço, por exemplo, para o Gustavo, para o Ricardo e para algum deputado eleito?

BR – Não vou antecipar nomes. Lógico que Ricardo e Gustavo são grandes lideranças que qualquer secretaria do estado seria pequena para o tamanho deles. Mas claro que se for, o desejo deles posso avaliar com muito bons olhos isso. Além de  ter um grande respeito por eles, pelo trabalho que desempenham no Congresso Nacional, grandes líderes, tive a oportunidade de caminhar com eles nessa campanha. Conheci melhor os dois e saímos com a amizade mais fortalecida.

OE –
E os deputados?

BR – Não avaliei nenhum. Não tenho um nome sequer até agora, a não ser o Flávio Arns (para a Secretaria de Educação). Talvez a Fernanda (Richa, mulher dele, na área social), não conversei com ela ainda, mas talvez a Fernanda. Não é porque é minha mulher, mas na área social ela pode ajudar muito o Paraná, a exemplo do que fez na capital. Na periferia ela é muito querida pela população. Eu brinco que se tivesse que disputar uma eleição com ela aqui em Curitiba, em muitos bairros eu perdia para ela.

OE – E a presidência da Assembleia Legislativa? O senhor vai respeitar aquele consenso da maior bancada e indicar alguém do PMDB ou prefere alguém do PSDB?

BR – Eu respeito a independência do Poder Legislativo. Os deputados escolhem, conversam entre si e depois, se quiserem, conversam comigo para avaliar um ou outro nome da nossa bancada. Evidente que quero que seja alguém da bancada de apoio, mas não vou interferir nisso. É uma questão interna da Assembleia Legislativa que eu não gostaria de participar.

OE – O PMDB pode integrar sua bancada de apoio?

BR –
Pode. Mesmo os deputados do PMDB que não me apoiaram – porque teve alguns lá que me apoiaram e até votaram em mim – temos uma relação de respeito. É a minha origem, do meu pai, que foi fundador desse partido. Boa parte dos que estão lá hoje são remanescentes do período do José Richa. Conheceram o estilo do meu pai, conhecem o meu. Nunca tivemos algum atrito que tenha fechado a porta para um futuro relacionamento político mais próximo. Tanto é que teve um determinado momento em que as conversas para uma composição com o PMDB (para a campanha) estavam bem avançadas, em que pese a dificuldade de relacionamento com o Requião.

OE – O senhor disse que a primeira ação do seu governo é enxugar a máquina e ao mesmo tempo prometeu investir 12% do orçamento na saúde, aumentar o salário dos professores e aumentar o efetivo da segurança pública. Em que etapa isso será possível?

BR –
Evidente que as propostas que eu tenho para o Paraná eu tenho ansiedade de fazer o mais rápido possível. Mas milagre ninguém faz, eu preciso botar a casa em ordem, sanear as finanças do Estado. Penso até na possibilidade de usar a mesma receita do Aécio Neves (ex-governador de Minas Gerais), adotada em muitos estados brasileiros, que é o auxílio do INDG (Instituto de Desenvolvimento Gerencial), que faz um pente-fino na administração, analisa todos os gastos da gestão. Desde material de expediente, frota, combustível, gastos com pessoal, gastos com diárias, viagens, tudo. No final, eles conseguem um orçamento inteiro de investimento a mais. Isso eles me mostraram quando estiveram em Curitiba. Acabaram não sendo contratados aqui, ainda, não tivemos pressa, porque eles falaram que a melhor situação de organização gerencial e financeira que encontraram no Brasil foi em Curitiba.

OE –
O investimento dos 12% do orçamento na área da saúde foi muito discutido durante a campanha. Será possível fazer isso já no ano que vem?


BR –
A nossa ideia é que seja já no ano que vem, porque a lei tem que ser cumprida. Por isso não podemos perder tempo. Estou aguardando esse diagnóstico da equipe de transição e já penso em, o quanto antes, entrar contato com o INDG para nos ajudar. Quero fazer uma gestão austera, vai ter dinheiro para investimento. Não vou fazer uma gestão com politicagem, com discurso. Quero fazer uma gestão de resultados.

OE – O interior, nesses últimos oito anos, foi, de certa forma, abandonado. Como vai se dar essa interiorização no seu governo?

BR – A,presentei na campanha a proposta de criação de 22 Redes (Regiões de Desenvolvimento) nas cidades polo do Paraná, levando serviços do Estado, inclusive com um programa que vai se chamar Tudo Aqui, aos moldes da Rua da Cidadania, e de um grande programa paulista, que é o programa Poupa Tempo. O cidadão vai ao prédio da prefeitura que tem todos os serviços: para tirar consultas, atestados, guias, certidão de nascimento, identidade, serviços da Sanepar, da Copel. E vou fazer as audiências públicas no interior, como fiz na capital.

OE – O governo atual reduziu a tributação em alguns insumos e aumentou em outros, como no caso de cigarros e bebidas alcoólicas. Como deve funcionar a tributação desses produtos no seu governo?

BR – Acho que foi uma medida acertada. São grandes contribuintes do Estado e representam próximo de 90% da arrecadação. E a isenção tributária dos microempresários também foi acertada, porque gera mais empregos, fortalece o comércio. Era algo que eu já discutia em 2002, quando fui candidato ao governo. Enfim, foi uma boa iniciativa e volto a afirmar: o que tem de bom no Estado nós vamos manter.

OE – Programas sociais também?

BR – Exatamente. Como eu mantive o Armazém da Família e melhorei. Eram 20 mil atendimentos por mês, hoje são 200 mil. Melhoramos a qualidade dos produtos. Eram sete fornecedores, aumentamos para 400. E diminuímos o preço cobrado das famílias de baixa renda. Tanto é que já tem parceria com várias cidades da Região Metropolitana. Beneficiei centenas de milhares de pessoas. E outro exemplo é o programa Mãe Curitibana, batemos recorde na redução da taxa de mortalidade. Então Tarifa Social da Água, Luz Fraterna, Trator Solidário, isenção tributária de microempresários, Leite das Crianças, vou manter e, possivelmente, aprimorar e ampliar.

OE – Agora com prefeitura e governo aliados pode mudar alguma coisa na concessão de licenças ambientais para aterros sanitários?

BR – IAP (Instituto Ambiental do Paraná) no meu governo não vai sair dando indiscriminadamente licenças ambientais. Seremos responsáveis, mas não vai haver politicagem. Houve muita perseguição, segurando licenças ambientais para me criar problemas administrativos na cidade, para de repente ter que jogar o lixo na rua. Teve momentos em que eu estava hiper preocupado de não ter onde jogar o lixo. Então politicagem, perseguição, jamais. Vamos ajudar os municípios do interior a fazerem seus projetos de aterro sanitário, os mais corretos e ambientalmente viáveis. Nosso projeto de implantação dessa usina é uma das melhores e mais modernas práticas que conhecemos no mundo. Foram dois anos de estudo, com 19 municípios que integram nosso Consórcio Intermunicipal de Destinação de Resíduos Sólidos. Só que por ser uma obra grande, poderosos consórcios se formaram e com poderosas equipes jurídicas, então tem uma guerra de liminares da Justiça que está dificultando a implantação dessa usina, além da demora da licença ambiental do Estado para duas áreas, em Fazenda Rio Grande e Mandirituba.

OE – Seu adversário explorou uma suposta desavença sua com os professores durante a campanha. Como vai ser o relacionamento com o sindicato da categoria (APP-Sindicato)?

BR – Da minha parte excelente. Não havendo politicagem nem questões ideológicas por trás, que prevaleça apenas o interesse dos professores, eu estou aberto a conversar com a APP de forma ordeira, civilizada, democrática, como é o meu estilo. Espero que o deles seja o mesmo.

OE – Como prefeito, o senhor deu início aos projetos de Curitiba para a Copa do Mundo de 2014. Como governador, vai dar sequência ao trabalho que vem sendo feito pelo Estado? Há algum projeto novo?

BR – Vamos contribuir em tudo o que for possível. Agora, honestamente, cabe à prefeitura, que é a principal responsável pela boa realização da Copa do Mundo. Eu sei, porque todos os projetos que foram aprovados pela CBF são da prefe,itura. O Estado não fez nada de projetos. É importante o peso político, a participação, a influência, dizer que o governo está à disposição para o que for possível. Mas a parte principal é da prefeitura. O governo pode ajudar com segurança pública, com uma ação integrada com as demais regiões do Estado, planejamento turístico para que o Paraná tire o maior proveito possível desse evento mundial. Ainda mais agora com a afinidade e a boa parceria que temos com o Luciano Ducci, as coisas ficarão muito mais fáceis.

OE – Há como inserir as cidades do interior nos programas relacionados à Copa?

BR – Vamos tentar. Quem sabe levar uma seleção para o interior. Tem a questão do turismo… Vamos fazer o que for possível, com integração das áreas da administração para todos tirarem proveito.

OE –
Além da Copa, o Brasil receberá as Olimpíadas em 2016. De que forma o Paraná pode participar?

BR – Não sei se o Paraná pode ter alguma participação. A Olimpíada será no Rio de Janeiro. Não sei se nosso Estado irá tirar algum proveito disso.

OE – O senhor se apresentou como um cabo eleitoral de luxo do Serra nesse segundo turno. O que dá para fazer para o Serra virar a eleição?

BR – Acho que agora com toda a união das principais lideranças do PSDB e partidos coligados dá para virar essa eleição. Aqui no Paraná vou entrar de corpo e alma na campanha e vai aumentar a diferença, pode escrever isso. Tenho recebido inúmeras ligações por dia de lideranças do interior, empresários e agora é Serra. Até porque essa passagem dele para o segundo turno, que não era esperada e a maioria dos institutos não apontava, deu um entusiasmo e um gás muito forte. Do outro lado (de Dilma), gerou uma frustração muito grande e uma certa fragilidade. Somado a isso, agora são tempos iguais na televisão e no rádio para os dois candidatos, coisa que não era no primeiro turno, o Serra levava uma grande desvantagem. Agora é olho no olho, mano a mano, confronto direto, comparação entre as duas propostas, entre as biografias e currículos entre os candidatos. E nesse aspecto, sem menosprezar a adversária, o Serra leva uma vantagem gritante.

OE – Como o senhor analisa o mapa eleitoral do Brasil depois desse primeiro turno tanto nas eleições para os governos dos estados quanto para o Congresso Nacional? O PSDB com essa eleição já no primeiro turno em São Paulo, Minas Gerais e Paraná saiu fortalecido e equilibrou o jogo, já que no Congresso os aliados do PT conseguiram ampla maioria?

BR – Deu uma equilibrada no jogo por serem estados importantes para o País. É uma vantagem boa, elegemos senadores inclusive. O problema é no Senado e no Congresso Nacional. Mais uma razão para votarmos no Serra. Imagina só o PT controlar tudo: a Presidência da República, o Senado, a Câmara, fazerem todas as mudanças que eles pretendem. Tenho até receio desse País virar uma Venezuela. Já basta os sinais que foram dados pelas lideranças do PT: “agora com a vitória da Dilma vai ser diferente, agora o PT vai mandar, coisa que não mandava no Lula”. Inclusive o Zé Dirceu falou que temos que rever esse excesso de liberdade para a imprensa, então veja só o risco que estamos correndo de eles terem o controle de todas as instituições. Já que eles ampliaram a bancada na Câmara e no Senado, é mais uma preocupação que deve ser levada a todos os eleitores.

OE – A troca da vice do Serra é uma boa estratégia?

BR – Acho que não tem razão disso. O vice (Índio da Costa) surpreendeu muita gente nas suas aparições, nos debates que participou mostrou conteúdo, consistência, uma boa visão em relação ao Brasil, foi eloqüente. Atendeu bem ao DEM, principal aliado. Eu não vejo razão para a troca. Não sei se tem essa discussão lá dentro.

OE – A Marina, sete anos ministra do Lula, te,m essa proximidade com o PT, até usou o Lula em certa fase da campanha. Como atrair os votos do PV para o Serra?

BR – Minha percepção, pelo comportamento dela na campanha e por sinais que ela já deu, é que ela fica neutra. Minha percepção é que os eleitores da Marina migrem naturalmente para o Serra. Ela tem um perfil de eleitor mais próximo do Serra do que da Dilma. As pesquisas que me mostraram aqui, não sei se confirmou depois, é que entre os eleitores com nível superior, ela estava em primeiro lugar no Brasil e é um eleitor mais próximo do Serra que da Dilma. Como o nosso (eleitor) aqui, conforme ia aumentando a escolaridade, aumentava minha diferença para o meu adversário. Eu só perdia para ele em escolaridade de 1ª a 4ª série.