Caso Carli Filho completa um ano hoje

O Ministério Público Estadual (MP), por meio do Tribunal do Júri de Curitiba, deve se manifestar hoje sobre o pedido do advogado da família de Gilmar Souza Yared, Elias Mattar Assad, para que seja marcado, o quanto antes, o interrogatório do ex-deputado Luiz Fernando Ribas Carli Filho.

Hoje faz um ano que ocorreu o acidente no bairro Mossunguê, em Curitiba, que resultou na morte não só de Gilmar, mas também de outro jovem, Carlos Murilo Almeida.

Várias testemunhas já foram ouvidas, mas Carli Filho, que foi denunciado pelo MP por duplo homicídio com dolo eventual e por dirigir embriagado, ainda não foi ouvido.

Por conta disso é que depois de um ano da ocorrência ainda se faz a leitura da impunidade. E o surpreendente é que os pais de Yared, Gilmar e Christiane, tiraram aspectos positivos da morte tão violenta de um filho.

“Hoje, nossa preocupação não é com a punição dele. O que nos preocupa mesmo é saber que de duas a três pessoas perdem a vida no trânsito, a cada dia, em Curitiba”, disse Gilmar.

O casal organizou uma organização não-governamental que atende famílias que passam pela mesma situação, que passam pelo drama de ver um filho morto e o assassino, impune.

“O que nos preocupa é a leitura que os jovens podem fazer da impunidade. Meu filho não vai voltar, mas as grandes vítimas somos nós, que estamos vivos, que corremos riscos no trânsito”, disse Gilmar.

Para Christiane, a sociedade vê o fato da seguinte forma: “Eu posso matar no trânsito que não vai acontecer nada. Já ouvi outras pessoas dizendo, bêbados, no trânsito, que “no Paraná o deputado matou e não foi preso, então você acha que vai acontecer algo comigo?’”, lamenta a mãe.

Na opinião de especialistas, as tragédias no trânsito só vão diminuir quando o motorista tiver consciência da coletividade, quando ele entender que ter atitudes corretas beneficiará todos e contribuirá para a paz nas ruas.

A pesquisadora e membro do Núcleo de Psicologia do Trânsito da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Iara Thielen, afirma que a sociedade “ampara” os crimes a partir do momento que se conforma.

“Hoje os crimes de trânsito estão banalizados, a sociedade está muito benevolente com isso. Como alguns pesquisadores dizem, o número de pessoas que morre no trânsito é tão elevado que não comove mais ninguém, o que é um absurdo”, analisa.

Pesquisas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) já deram conta de que o número de mortos em consequência de acidentes de trânsito é 66% maior do que os contabilizados pelos órgãos da área, como Denatran ou Ministério da Saúde.

“Esses órgãos não levam em conta que muitas pessoas morrem dias, ou meses após o acidente”, diz a professora. Iara afirma, ainda, que o brasileiro não leva a sério a legislação de trânsito. “Em pesquisas, quando a gente pergunta o que é excesso de velocidade, as pessoas têm diferentes respostas, não entendem que têm que respeitar o que está escrito na placa, ou coisa parecida. Elas querem fazer sua própria lei”, afirma. Para a especialista, as leis de trânsito devem ser taxativas, como a Lei Seca, por exemplo, que diz o que pode ou não pode fazer.

Justiça ainda aguarda declarações de testemunhas de defesa

Mara Andrich

A audiência para ouvir o ex-deputado ainda não foi marcada porque o juiz da 2.ª Vara do Tribunal do Júri, Daniel Avelar, aguarda o depoimento de três testemunhas que seriam ouvidas por carta precatória.

Uma está em Cuiabá, no Mato Grosso; outra em Joinville, Santa Catarina; e a última em São Paulo, capital. Duas delas não foram encontradas, para prestar depoimento. Então, provavelmente, a defesa do ex-deputado deverá se pronunciar sobre o tema também, além do Ministério Público.

Ao todo, já foram ouvidas mais de 20 testemunhas em dois dias de audiências de instrução no Tribunal do Júri (em fevereiro e março). A família Yared chegou a contratar advogados em outras cidades para que o processo de oitiva das cartas precatórias fosse agilizado.

O advogado da família Yared, Elias Mattar Assad diz que, levando em conta a complexidade do caso, o processo está “andando”. “Para começar ele perdeu o mandato. Segundo, as provas mostraram que ele estava com a carteira suspensa. Terceiro, temos uma denúncia criminal que já está no Tribunal do Júri e as testemunhas já confirmaram tudo. Então não posso dizer que nada aconteceu com ele até agora”, analisou Assad. Um culto ecumênico será realizado hoje, às 20h, no local do acidente.

Morro do Boi foi mais rápido

Mara Cornelsen

Em um ano, Juarez Ferreira, acusado de balear um casal de namorados no Morro do Boi (em 31 de janeiro de 2009), em Caiobá, matando o rapaz e deixando a moça paraplégica, foi indiciado, processado e condenado a 65 anos e 5 meses de prisão, sem que houvesse prova material contra ele. Já no caso de Carli Filho, ele sequer foi interrogado pela Justiça.

“Perfeição”

Para Mattar Assad, que atende a família de Gilmar Yared e ajudou a família das vítimas do caso do Morro do Boi, o processo do acidente é uma “Mona Lisa”, único no Brasil, em que, desde o delegado até o juiz, estão preocupados em garantir ampla defesa ao réu.

Já Nilton Ribeiro de Souza, defensor de Juarez, avalia que a Justiça sequer esclareceu porque a arma do crime foi apreendida com outro suspeito, que chegou a confessar o atentado ao casal, mas que até hoje está em liberdade.

“A defesa de Juarez foi totalmente cerceada, por isso garanto que este processo será anulado”, disse Souza, reforçando que a atitude do juiz do caso Carli Filho é correta e admirável, pois quando o julgamento do ex-deputado acontecer (o que pode demorar até 3 anos) será único, com sentença final, sem chance de anulação.