Juiz é acusado de matar promotor de justiça

Vinte anos depois de ter sido acusado de assassinar o promotor de justiça Francisco Bezerra Cavalcante, no Fórum de Ortigueira, o juiz aposentado Luiz Setembrino Von Holleben e a escrivã criminal da mesma comarca, Maria Júlia de Oliveira Loyola, serão levados a julgamento, em Curitiba, na próxima terça-feira.

Ambos serão defendidos pelo advogado Roberto Brzezinski Neto e acusados pela promotora Lúcia Inez Giacomitti Andrich, que contará com o assistente de acusação Josafar Guimarães.

O caso se arrasta por duas décadas, do interior do Paraná até a mais alta corte em Brasília, período em que foram esgotadas praticamente todas as possibilidades jurídicas de impedir que o juiz aposentado fosse levado a júri. Luiz Setembrino alega inocência, garantindo que tudo não passou de um acidente.

Em sua versão, ele afirma que a vítima derrubou a pistola Colt 45 que manuseava. A arma, ao bater no chão, disparou, acertando o coração do promotor.

A bala atravessou o corpo dele e alojou-se na parede. O juiz e alguns amigos levaram-no ao hospital local, mas ele já estava morto. O crime ocorreu em 15 de junho de 1989.

O episódio teve desdobramentos que levaram ao enquadramento da escrivã, que responde por falsidade ideológica e falsificação de documento público. Ela é acusada de forjar provas para inocentar o juiz. Mais cinco pessoas estavam no processo, com diferentes envolvimentos, mas devido ao tempo transcorrido, não podem ser punidas.

Perícia

Apesar do esforço da defesa em manter a versão do acidente, o trabalho do perito em balística Eraldo Rabelo colocou por terra a possibilidade, ao emitir parecer dizendo que “havia impossibilidade física” da vítima se responsável pelo disparo. A forma como a bala atingiu Cavalcante e a descrição da cena feita pelos envolvidos não são compatíveis.

Em sua defesa, o juiz assegura que era amigo de Cavalcante, que não tinha nenhum motivo para matá-lo e que haviam trabalhado juntos em duas comarcas (Curiúva e Ortigueira) sem que nenhuma desavença entre eles tivesse ocorrido.

Pistola

A esposa do promotor, Mioko Katana Cavalcante, 52, que atualmente mora em Londrina com os dois filhos, estará presente no julgamento. “Não estou convencida de que foi acidente”, afirmou ela, ressaltando que seu marido era um promotor novo na carreira (tinha 32 anos quando morreu) e era muito dedicado.

Ela também lembra que ele tinha um revólver calibre 38 e nunca soube que possuía uma pistola automática. “Pelo que eu sei, esta pistola teve a numeração raspada após a morte do meu marido”, recordou.

Arrogância e censura

O advogado de defesa do juiz Luiz Setembrino não quis comentar o caso. Roberto Brzezinski Neto disse apenas que foi “intimado” pelo 2.º Tribunal do Júri e que não iria se manifestar. O juiz se aposentou em 2000, depois de passar 17 anos na magistratura estadual e durante sete como presidente do Tribunal do Júri de Ponta Grossa.

De personalidade forte e considerado “arrogante”, ele recebeu críticas da Federação Nacional de Jornalistas (Fenaj) e do Sindicato dos Jornalistas do Paraná (Sindijor-Pr), por ter, em 1998, tentado impedir que a publicação da denúncia de violência sexual contra um político.

Ele expediu mandado de busca e apreensão, notificação e citação contra a TV Cidade (emissora a cabo) e intimou os demais veículos de comunicação do município. Por conta do mandado, alguns jornais de Ponta Grossa chegaram a ser apreendidos, mas a notícia foi divulgada por jornais de outros municípios.

Entrevista

Ao ser submetido a uma entrevista para estudo psicológico e social (praxe com todos os réus) na Vara Privativa do 2.º Tribunal do Júri, Luiz Setembrino também não se mostrou muito amistoso.

Ao chegar, disse que &ldq,uo;não era réu, porque o caso foi um acidente, transformado em crime por um perito e um delegado sensacionalistas e corruptos que atenderam a ocorrência”.

Quando lhe perguntaram como via a Justiça, respondeu: “Ela é feita por homens que são sérios ou que não são sérios. Os pobres não tem oportunidade e as cadeias estão cheias de putas, pretos e pobres”.