Donos da Schincariol são presos por sonegação

Daniel Pera

Gilberto Schincariol foi preso
ontem em São Paulo.

Brasília e São Paulo – Uma operação conjunta da Receita Federal e da Polícia Federal (PF) prendeu mais de 60 pessoas na manhã de ontem suspeitas de envolvimento com um esquema de sonegação de impostos que teria sido montado pelo grupo Schincariol. Entre os detidos estão sete sócios e executivos da segunda maior cervejaria do País. A Justiça Federal decretou a prisão de 79 pessoas. Os suspeitos são acusados de sonegar cerca de R$ 620 milhões por ano. A Schincariol detém em torno de 14% do mercado consumidor de cerveja no Brasil, produzindo 2,1 bilhões de litros de cerveja por ano, chope, refrigerantes, águas minerais, concentrados, sucos e produtos energéticos, com fábricas instaladas de forma estratégica em várias regiões do País e empregam cerca de 5 mil trabalhadores de forma direta.

As ações contra um dos maiores esquemas de sonegação já visto no País concentraram-se nas indústrias de cervejas e refrigerantes do grupo, em especial as instaladas em Itu (SP) e Cachoeiras de Macacu (RJ). Além das empresas do grupo Schincariol estariam envolvidas no esquema as empresas Dismar Comercial Ltda., Disbetil Distribuidora de Bebidas Timbaubense Ltda., Fácil Comércio de Alimentos e Bebidas, Transpotencial Ltda. e Mas Import Comércio e Distribuição de Bebidas Ltda.

As investigações indicam que o grupo montou, com alguns de seus distribuidores terceirizados, um grande esquema de sonegação fiscal de tributos estaduais e federais, utilizando o subfaturamento na venda de seus produtos com o recebimento ?por fora? da diferença entre o real valor de venda e o valor declarado nas notas fiscais. Também foram identificadas operações de exportação fictícia, intermediadas por empresas situadas em Foz do Iguaçu e importação com falsa declaração de conteúdo e classificação incorreta de mercadorias.

Parte da matéria-prima usada nas fábricas seria adquirida sem a devida documentação fiscal, envolvendo operações simuladas com empresas inexistentes ou de capacidade financeira insignificante, localizadas em estados do Nordeste, como se fossem estas as adquirentes.

Ainda segundo as investigações, o esquema foi aperfeiçoado após sucessivas autuações dos fiscos estaduais e federal contra o grupo, que a partir de determinada época teria começado a melhor maquiar e ocultar as práticas ilegais, utilizando os seus distribuidores para se eximir de responsabilidade. Os lucros obtidos pelo grupo seriam remetidos regularmente dos distribuidores ?parceiros? para a sede do grupo em Itu. Somente um dos distribuidores investigados chegava a enviar cerca de R$ 1 milhão por mês.

As importações de matéria-prima e de equipamentos para as fábricas são intermediadas por empresas do grupo sediadas na Ilha da Madeira (Portugal).

Além de Gilberto Schincariol e seus filhos, Gilberto Júnior e José Autusto, foram presos os sobrinhos Adriano e Alexandre Schincariol e os diretores José de Assis Carvalho (administrativo) e José Domingos Francischinelli (financeiro). Todos os executivos foram detidos em suas casas e levados para a sede da PF na capital paulista.

Ameaça de bombas para entrar em mansão

São Paulo – Na mansão de Gilberto Schincariol e seus filhos, os seguranças não queriam abrir os portões, temendo seqüestro. Um dos policiais que participaram da operação disse que a negociação com os três foi muito difícil e que eles só permitiram a entrada na mansão após a PF ameaçar usar explosivos para abrir a passagem. A casa é protegida por seguranças do lado de dentro da casa e na rua. Os três saíram do local algemados. ?O sistema de segurança era muito forte. Parecia uma embaixada ameaçada de ataque terrorista?, disse o policial.

Cofres abarrotados

Policiais e fiscais encontraram dois cofres em paredes falsas na sede da Schincariol em Itu e numa distribuidora ligada à empresa em São Gonçalo (RJ).

?Os cofres estavam abarrotados de dinheiro. Era muito dinheiro. Tinha dinheiro demais?, disse um dos coordenadores da operação.

Foram apreendidas também placas de caminhão que, segundo as investigações, seriam usadas para simular a distribuição de cerveja em estados com ICMS mais baixo. O artifício permitia a entrega das bebidas com preços baixos mesmo em mercados com alíquotas de imposto mais altas.

A operação, que a Receita Federal chama de ?Pista Livre?, é a maior já realizada contra sonegação e mobiliza 830 policiais federais e 180 auditores fiscais da Receita. As prisões e buscas acontecem em São Paulo, Rio de Janeiro, Goiás, Maranhão, Pernambuco, Pará, Ceará, Rio Grande do Norte, Minas Gerais, Espírito Santo, Paraná e Tocantins.

As investigações começaram a ser feitas pela Receita Federal há dois anos, que logo acionou a Polícia Federal. A partir daí, fiscais e policiais trabalharam juntos para recolher as provas da sonegação.

Preso advogado

A Polícia Federal prendeu no Espírito Santo advogados e um gerente ligados ao grupo Schincariol. O advogado Bellini José Salles Ramos, apontado pela Receita Federal como suspeito de participar de um esquema fraudulento envolvendo a cervejaria, foi preso no início da manhã de ontem.

Bellini é acusado de sonegação fiscal, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. De acordo com a Polícia Federal, o advogado conseguia liminares para reduzir o valor do ICMS e assim baixar o preço dos produtos da cervejaria no estado. O advogado foi detido dentro do próprio apartamento na Praia do Canto, em Vitória. De acordo com policiais federais, Bellini não resistiu à prisão e chorou quando foi algemado.

Outras três pessoas também foram detidas e já estão na sede da Polícia Federal. Entre elas, um outro advogado preso no bairro Mata da Praia e um homem identificado apenas como Domingos, que seria irmão de Bellini.

O gerente da distribuidora Desmar, responsável pela marca no Espírito Santo, Rodrigo de Aguiar Peixoto, foi preso no bairro Laranjeiras, na Serra, ao chegar ao trabalho.

A PF acredita que a empresa funcionava apenas como fachada, já que no endereço onde estaria instalada havia apenas um galpão. Rodrigo Peixoto levou os policiais federais até uma gráfica, em Jacaraípe, onde foram apreendidos blocos de notas fiscais.

Foz: exportador falsificava data de validade

Diogo Dreyer

O empresário Mahamoud Ahmad Omairi, dono da Distribuidora e Exportadora Purchase, em Foz do Iguaçu, foi preso na madrugada de ontem, por volta das 4h, por agentes da Polícia Federal. Detido no local, ele é acusado de fazer parte do esquema de fraudes de sonegação de tributos federais e estaduais através de subfaturamento de produtos da Schincariol. O descendente de libanês também é acusado de intermediar operações de exportação fictícia com falsa declaração de conteúdo e classificação incorreta de mercadorias.

Na sede da empresa a Polícia Federal apreendeu também uma carreta carregada com produtos da Schincariol, sendo na maioria latas e garrafas de cerveja e refrigerantes. Todas estavam com a data de validade vencidas. ?Eles estavam raspando a data impressa no fundo da mercadoria e reimprimindo com nova validade. A intenção era revender assim mesmo?, afirmou o delegado da PF, Geraldo Pereira. Segundo o delegado, esse caso deve ser investigado pela vigilância sanitária. O empresário foi o único detido no Paraná ligado à Operação Cevada. Mas a PF não descarta a hipótese de que mais prisões ocorram no Estado.

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