Sempre em obras

Burocracia é apenas um dos fatores que encalham obras em Curitiba

Obras públicas e atraso de cronograma, essa correlação é quase via de regra para a realidade brasileira e Curitiba não é exceção.

Basta cruzar a cidade de Norte a Sul para verificar uma série de espaços cuja expectativa gerada pelo anúncio do projeto foi transformada em frustração. No levantamento realizado pela Tribuna, há pelo menos 10 obras nessa situação (veja a relação).

Os sucessivos adiamentos de cronograma são motivados por: alterações de projeto, descumprimentos de contratos, atrasos de repasses, problemas climáticos, entre outros entraves. Em comum, tanto a unidade de saúde paralisada, quanto o terminal de ônibus que não foi concluído ou o metrô (que para uma parcela da população integra uma das lendas da capital) precedem anúncios entusiasmados dos gestores, que desconsideram a realidade de toda a tramitação legal que envolve o chamado “ciclo de investimento” de cada novo empreendimento.

De acordo com uma projeção da Secretaria Municipal de Planejamento e Administração (Seplad), uma obra relativamente simples como um Centro Municipal de Educação Infantil (CMEI) que inicie do zero (fase de estudo/concepção), consome pelo menos 640 dias até ser inaugurada em função de toda a tramitação prevista em lei. “Não é um processo rápido, pois assim como as obras privadas, os nossos projetos são submetidos aos mesmos critérios e rigores de fiscalização para a liberação de órgãos ambientais e de segurança, e isso é só uma parte de tudo que envolve empreendimentos públicos”, explica a superintendente de planejamento da Seplad, Ana Jayme.

Além disso, a obra pública depende da análise e aprovação de vários órgãos a fim de garantir a transparência na escolha das empresas e no emprego dos recursos (veja o quadro do ciclo). “Quando se anuncia uma obra, o prazo é sempre em um cenário otimista e que perseguimos trabalhar com o melhor dos mundos, mas a execução tem um acréscimo, pois envolve um cenário realista, daí a sensação de atraso constante”, admite Ana. E dependendo da complexidade da obra essa diferença de tempo aumenta consideravelmente.
Descompasso eterno

Outro fator que contribui para essa sensação de atraso constante é que entre a divulgação da intenção de se fazer um determinado projeto e a concretização de tal ação há meses e até anos de variação. Os recursos que viabilizaram a Linha Verde Norte exemplificam isso. Mesmo com os três entes, federação, estado e município trabalhando juntos, o aporte financeiro de R$ 50 bilhões para as obras de mobilidade em todo o país foi anunciado em setembro de 2013 e a assinatura do convênio com Curitiba, saiu em maio de 2014. “Foram oito meses de diferença, o que nem é incomum, mas impacta em orçamentos que ficam desatualizados e em cumprimento de prazos”, aponta.

Segundo a Seplad, atualmente, a assinatura do termo de compromisso (veja o quadro) com as fontes de recurso é fundamental em obras que envolvem o município devido ao grau de comprometimento financeiro que Curitiba tem com a manutenção de toda a infraestrutura já construída, os chamados equipamentos públicos. “São 2436 equipamentos públicos, contra 16 no início da década de 1970. Muito do orçamento está comprometido em manter essas estruturas, daí a necessidade de parcerias e da devida formalização disso para garantir os recursos da obra. E mesmo com essas garantias, ainda existem atrasos em repasses, o que também altera os prazos”, aponta Ana.

Blindados pela sociedade

A demora para garantir transparência na execução de uma obra pública, porém, não é a única responsável por essa dilatação de prazos e nem pode ser vista como algo, negativo, já que atende a um modelo democrático de gestão. Em países de regimes totalitários, a agilidade também se deve a falta de prestação de contas à sociedade. De qualquer forma, os atrasos nas obras públicas também se devem à falta de eficiência nos modelos de planejamento e controle do serviço público. “A organização do estado segue arcaica, mesmo com tantas ferramentas tecnológicas capazes de garantir clareza e transparência na produção de informações em tempo real, avalia o vice-presidente do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Paraná (Senge), Valter Fanini. Isso somado a gradativa precarização dos quadros técnicos de carreira nas instituições públicas acaba interferindo no desempenho de todas as ações.

“Regrediu a capacidade gestora porque gradativamente houve um esvaziamento dos quadros técnicos, daí a grande dificuldade de planejar, projetar e controlar as obras. E só se olha para o resultado, o atraso da obra e o desperdício de recursos, sendo que isso é decorrência de falta de performance por conta da fragilização de toda a estrutura”, aponta.

Na Seplad, algumas iniciativas se voltam para isso, como o Programa de Melhoria da Receita e do Gasto Público e está em vias de ser assinada uma operação de crédito junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES)  que irá financiar o Programa de Modernização de Gestão da Prefeitura. “Avançamos em muitos aspectos e devemos melhorar ainda mais, mas a melhor blindagem institucional para a entrega de uma obra pública é o acompanhamento e a cobrança da sociedade”, defende Ana.

Caminhos para garantir agilidade e barrar problemas

Em pelo menos dois aspectos que geram atrasos, há alguns antídotos que tendem a colaborar para ganho de tempo das obras públicas. Um deles está relacionado com a flexibilização da lei das licitações (Lei 8666/1993) para obras na área de saúde, educação e de mobilidade urbana, por meio do Regime Diferenciado de Contratações Simples (RDC). Curitiba já fez uso do RDC Simples, que em linhas gerais permite uma redução de 50% no tempo gastos com as licitações, por dispensar a necessidade de duas licitações, uma para a escolha da empresa que fará o projeto e outra para a que fará a execução da obra. Só que o requisito para o RDC Simples é que a obra parta de um projeto modelo. Outra modalidade ainda não suada por Curitiba, mas que também pode otimizar o processo é o RDC integrado que permite uma licitação para a seleção da empresa que fará o projeto e a obra. “Além da economia de tempo com os dois editais e prazos de recursos existe um ganho de qualidade já a empresa que fará o projeto tende a ser a mais indicada para executar a obra”, aponta a superintendente de planejamento, Ana Jayme.

Em relação aos problemas com descumprimentos e atrasos das empresas contratadas, a Prefeitura explica que prevê multas e notificações em contratos e já desenvolveu uma prática para se resguardar instaurando um processo administrativo em que há abertura para o contraditório.  Em situações que o processo seja encerrado com a conclusão de descumprimento contratual ou fraude, a administração pode advertir, suspender ou tornar o fornecedor desqualificado para novas licitações. O tempo de suspensão varia e pode afastar uma empresa de pregões municipais por até dois anos, por exemplo, ou até cinco anos, em questões mais sérias. No caso da inidoneidade, o fornecedor fica impedido de realizar novos contratos bem como seus eventuais contratos existentes são rescindidos.

É o seguinte!

Nós nunca vamos entender, mas sempre a burocracia é o motivo para atrasos de obras públicas. Tudo porque se trata de dinheiro que não é do administrador. É nosso. Então, se é assim, por que não anunciar  a obra depois de todo o estudo pronto, não é?

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