Pesadelo verde

Saiba como funciona um condomínio rural dentro da lei

Sandro Setim, diretor técnico da Coordenação da Região Metropolitana (Comec), ligada à Secretaria Estadual do Desenvolvimento Urbano, explicou que os administradores dos loteamentos irregulares Viridi Viam Home Hotel, em Almirante Tamandaré, e o Espaço Ambiental Home Hotel, em Tijucas do Sul, não fizeram nenhuma consulta à Comec, sobre as regras de ocupação do solo, referente a nenhum dos empreendimentos.

Ele também informou que recebeu a denúncia da suposta ilegalidade dos loteamentos, analisou documentos recebidos referentes ao Espaço Ambiental, verificou indícios de irregularidades e encaminhou tudo aos órgãos competentes, solicitando providências. Foi este encaminhamento que deu origem a um inquérito policial na Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente, no início de outubro. O Ministério Público em São José dos Pinhais é outro órgão que recebeu a denúncia. Abriu investigação na 1.ª Promotoria (Urbanismo) e outra na 6.ª Promotoria (Ambiental). Além disto, a 3.ª Vara Cível de São José dos Pinhais já emitiu liminar, impedindo a venda de outros lotes no empreendimento.

Preservação ambiental também é lei

Outra questão a ser considerada na criação de condomínios rurais é o impacto ambiental. Grande concentração de pessoas incorrem em maior poluição e degradação do meio ambiente. Para evitar isto, existe a lei 6.938/81, que regulamenta a política nacional do meio ambiente e seu descumprimento gera multas entre R$ 500 e R$ 10 milhões.

O artigo 10 e 11 desta lei dizem que: “A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental dependerão de prévio licenciamento ambiental. // parágrafo 1.º: Os pedidos de licenciamento, sua renovação e a respectiva concessão serão publicados no jornal oficial, bem como em periódico regional ou local de grande circulação, ou em meio eletrônico de comunicação mantido pelo órgão ambiental competente. // Compete ao Ibama propor ao Conama normas e padrões para implantação, acompanhamento e fiscalização do licenciamento previsto no artigo anterior, além das que forem oriundas do próprio Conama.”

IAP

Os condomínios Viridi Viam e Espaço Ambiental, comercializados pelo Grupo Pedra, já foram autuados pelo Instituto Ambiental do Paraná (IAP). Na quarta-feira (19), o órgão detalhou todos os procedimentos (crimes e pedidos de licença) solicitados para cada loteamento. Alguns não foram fáceis de levantar no sistema do IAP, já que autuações e licenças para um mesmo condomínio foram registrados em CNPJs diferentes do Grupo Pedra.

O Espaço Ambiental, em Tijucas do Sul, foi autuado em 26 de março por derrubada de mata nativa, o que resultou no embargo do empreendimento. Mas um dos sócios assinou um Termo de Ajuste de Compromisso (TAC) e fez a recomposição florestal, o que normalizou toda a situação. Em janeiro, o Espaço Ambiental solicitou a Dispensa de Licenciamento Ambiental Estadual (DLAE), alegando que sua atividade comercial era hotel de pequeno porte. O documento foi concedido em maio. No entanto, como os fiscais do IAP verificaram que o TAC não estava sendo cumprido e também constataram parcelamento e movimentações ilegais do solo, além da venda dos lotes, a DLAE foi suspensa.

O Viridi Viam, em Almirante Tamandaré, foi autuado em agosto de 2013 por parcelamento ilegal do solo, abertura de estradas e atividades imobiliárias não autorizadas no local, o que gerou uma multa de R$ 80 mil. O local foi embargado, mas como a venda de lotes continuou, o condomínio levou outra multa de R$ 10 mil. Num CNPJ diferente dos que foram lavradas as autuações, o Grupo Pedra solicitou a DLAE, que ainda está vigente. No entanto, diante da descoberta que os dois CNPJs se referem ao mesmo empreendimento, o IAP afirmou que o documento será suspenso.

Num dos CNPJs do Grupo Pedra (S.B. M. ,Gestão Imobiliária Ltda. – ME), o IAP ainda localizou quatro autuações por infração ambiental num empreendimento em Agudos do Sul.

APA

No Viridi Viam há outro agravante. Está instalado em Áreas de Preservação Ambiental (APA) do Passaúna, onde empreendimento com tão alta concentração humana – cerca de 100 lotes em torno dos mil metros quadrados cada – é proibido.

Na APA do Passaúna, a legislação estadual (Decreto estadual 5.063/01) diz que, além do incorporador ter que atender às exigências ambientais, o parcelamento de solo para fins urbanos, como condomínios residenciais horizontais (com mais de 20 unidades), depende de parecer prévio da Coordenação da Região Metropolitana (Comec), que já esclareceu que os administradores do Viridi Viam e do Espaço Ambiental não lhe fez qualquer consulta acerca disto. Em complemento a estas leis ainda há o artigo 8.º da Resolução 10/1988 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), que diz que “nenhum projeto poderá ser implantado em uma APA, se a prévia autorização de sua entidade administrativa.”

Dá pra fazer loteamento em área rural? Só se for improdutiva

Se fazer um condomínio em área urbana já é complicado, em área rural ainda há mais um agravante, dado pelo artigo 96 do Decreto 59.428/66 (política de acesso à propriedade rural). Ele diz que projetos de loteamentos rurais, com objetivo de urbanização, industrialização ou sítio de recreio, para serem aprovados, só pode ser feitos em áreas que já sejam consideradas urbanas (ou em planos de urbanização); se foi oficialmente declarada zona de turismo, estância hidromineral ou balneária; ou que comprovadamente tenha perdido suas características produtivas (agropastoris).

E para provar que a área é improdutiva, o artigo 53 da lei 6.766/79 (sobre parcelamento do solo) diz que toda alteração de uso do solo rural para fins urbanos depende antes de análise e aprovação do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e do órgão metropolitano (neste caso, a Coordenação da Região Metropolitana – Comec). Mas, se estas análises existem, não foram mostradas aos compradores dos condomínios Viridi Viam e Espaço Ambiental. A Prefeitura de Almirante Tamandaré até informou que o estudo é possível, mas até o fechamento desta reportagem, não foi solicitado pelos administradores do Viridi Viam, que já tinham sido orientado sobre isto no início do ano.