Privilégio de poucos

Sonho de trabalhador é realidade de um seleto grupo

Cerca de 60 dias de férias todos os anos, além de um salário superior a R$ 13 mil por mês. O que soa apenas como um sonho para o trabalhador comum é realidade para políticos, promotores, procuradores e juízes brasileiros. Um privilégio difícil de ser engolido pelo cidadão, mas que os beneficiados fazem de tudo para justificar.

O período prolongado de férias de políticos e alguns funcionários públicos já foi motivo de muita polêmica. No Congresso Nacional, assembleias estaduais e câmaras municipais, o período de recesso já foi muito maior. No Paraná, o recesso da Assembleia Legislativa chegava a 90 dias, mas caiu para 55 em 2007. Na Câmara de Curitiba, foi fixado em 73 dias em 2011.

No Judiciário, os 60 dias de férias de juízes, promotores e procuradores já foram questionados até pelo ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Cezar Peluso. Mas o privilégio segue em vigor e é defendido pelas associações de classe da magistratura e pelo Ministério Público.

Para o advogado Marco Aurélio Guimarães, professor de Direito do Trabalho da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), é necessário avaliar cada caso com cuidado antes de apontar as férias mais longas como mordomia. “É uma desigualdade, mas é preciso observar as prerrogativas de cada categoria. Não podemos colocar todos no mesmo barco”, afirma.

Diferente

O presidente da Assembleia Legislativa do Paraná, deputado Valdir Rossoni (PSDB), alega que os períodos de recesso não representam férias para os parlamentares. “Os gabinetes seguem funcionando e os deputados, trabalhando em seus projetos. A única diferença é que não há sessão”, argumenta. Ele lembra ainda que a emenda constitucional que reduziu os períodos de recesso também acabou com os “jetons”, remuneração extra que os deputados recebiam pela realização de sessões extraordinárias.

A Câmara Municipal de Curitiba, através de sua Procuradoria Jurídica, informa que os vereadores “são agentes públicos, não são servidores ou trabalhadores na acepção jurídica do termo. Portanto, não têm direito a férias”. Segundo a Câmara, “os vereadores continuam com suas atividades nas comissões permanentes e temporárias, bem como suas demais atividades do mandato. Se o vereador quiser se afastar de suas atividades no período de recesso, deve solicitar licença”.

Arquivo
Juízes citam particularidades.

Beneficiados alegam desgaste

Para o presidente da Associação dos Magistrados do Paraná (Amapar), Fernando Swain Ganem, as particularidades da função de juiz justificam os 60 dias de férias. “O juiz não tem uma jornada de trabalho fixa. Está à disposição 24 horas por dia. Quando fecha o gabinete, leva toda uma carga de trabalho para casa. Não é um privilégio, é uma peculiaridade do cargo”, defende.

O Ministério Público do Paraná aponta também o desgaste físico e emocional provocado pela atividade dos procuradores e promotores. “Essa regra é resultado do reconhecimento legislativo desse tipo de atividade, tal qual ocorre em relação a outras atividades específicas que demandem especial esforço de trabalho”, cita a nota enviada pela Procuradoria Geral de Justiça.

Para o professor Marco Aurélio Guimarães, os mesmos argumentos poderiam ser usados por todos os trabalhadores. “Seria ótimo se todos tivessem os mesmos benefícios. Um operário também sofre desgaste físico e emocional, assim como outras categorias. Algumas contam com férias maiores, outras n&at,ilde;o”, pondera. Guimarães avalia como excessivos os recessos do Legislativo. “Acho uma barbaridade. As casas legislativas já trabalham pouco e são ineficientes. No Judiciário, apesar de todas as reclamações, as coisas estão melhorando. É uma discussão de princípios. É a sociedade que deve  debater e avaliar se aceita esses privilégios”, avalia.

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