Dono de cachorro que ataca trabalhador pode ser preso

Quem é dono de cachorro talvez não saiba o que estes animais representam no dia a dia de funcionários de empresa prestadoras de serviços, como leituristas, carteiros, entregadores de gás, coletores de lixo, e outros.

As cicatrizes nas pernas, braços, nádegas, abdômen, rosto, e até no seio são a parte visível de quanto sofrem estes trabalhadores. Há também os traumas psicológicos.

“Todo dia é uma luta. Convivemos com a expectativa de que nem sempre os nossos funcionários voltarão do trabalho sem ter sofrido ataque ou ser mordido por um cachorro”, destaca Francisco Carlos Marques, da Unidade de Faturamento da Sanepar, gerente de uma equipe de 150 empregados que, diariamente, estão sob a ameaça dos animais.

Os números mostram que os casos estão aumentando. No ano passado, dos 590 leituristas da Sanepar que atuam no Estado, 147 foram mordidos. Neste ano, até o mês de agosto foram outros 90 acidentes. Em Curitiba e Região Metropolitana, entre os 150 que trabalham na atividade, 49 foram vítimas de cães no ano passado e, só em 2009, já são 24 casos.

A leiturista Diovani Moczenski – que trabalha na rua há três anos e meio – exibe sem nenhum orgulho as marcas pelo corpo. Ela já foi mordida cinco vezes. Diovani diz que a última vez foi a pior, porque além dos pontos que levou, o que “mais doeu foi que o ataque ocorreu sob o olhar da dona, que havia autorizado minha entrada no imóvel e não conteve o cachorro.

Eu já estava sangrando e mesmo assim a dona do animal arrancou da minha mão a única defesa que eu tinha, que é a vareta que nós leituristas usamos. Quando meus colegas chegaram para me prestar socorro, a dona do cachorro negou que eu tivesse sido agredida”.

Apesar de negar o ataque, a dona – de acordo com a decisão da autoridade judicial – foi condenada a pagar cestas básicas. A condenação do dono de cachorro é talvez a única esperança que resta aos leituristas.

“Muitos proprietários não sabem que a Lei de Contravenções Penais (Decreto-lei 3.688/41) prevê prisão de dez dias a dois meses para o dono de animais que oferecem risco à segurança da coletividade”, enfatiza Francisco.

Além da prisão, o juiz também pode determinar outras penas como o pagamento de multa, prestação de serviços comunitários e o pagamento de cestas básicas. A Sanepar pode, inclusive, pedir ressarcimento dos prejuízos causados pelos dias parados do empregado mordido e dos custos com medicamentos, cirurgia e tratamento psicológico.

A falta de responsabilidade do dono do cão também comove Francislaine Soares que, em três anos fazendo a leitura e entrega das contas de água, foi mordida três vezes e sofreu outros quatro ataques, onde conseguiu se defender do cachorro.

Chorando, ela embra quando percebeu que dois cães rottweilers, muito agitados, estavam soltos no pátio e que o cadeado do portão não estava batido. Apesar de a dona do imóvel estar em casa, nada fez quando os animais escaparam.

“É assustador ver o bicho vindo em sua direção. Você sabe que vai ser atacado”. Francislaine, nesta vez, foi socorrida por uma vizinha. Em outro ataque, um pitbull, além de mordê-la, arrancou a manga do uniforme. “É muita falta de sensibilidade permitir que o seu animal agrida um ser humano. É revoltante, porque estamos cumprindo a nossa função e há clientes que não demonstram o menor respeito por nós”, desabafa.

Há 15 dias trabalhando na Sanepar, Emerson José Pereira diz que não foi mordido ainda. Mas já teve de enfrentar cachorros soltos. “Principalmente na periferia, eles andam em grupo e são uma ameaça constante”, diz.

Emerson já sabe que as estatísticas demonstram que, no período de um ano na atividade, um a cada quatro leituristas tende a ser atacado por cão. Ele recebeu a informação durante o treinamento realizado nesta quinta-feira (29), que contou com a palestra de policiais do Canil da Tropa de Choque, da Polícia Militar.