Segurança

Curso de formação para Polícia Civil tem aulas questionadas

Saber a diferença entre os tipos de taças e talheres, e como se deve comer de forma adequada iguarias da culinária, além de conhecer as técnicas de relaxamento e respiração. Junto com muitas aulas de tiro, exaustivos conhecimentos de técnicas de investigação, treinamento físico e outras disciplinas práticas, os cerca de 300 novos policiais civis que nos próximos meses devem ganhar as ruas do Paraná recebem conhecimentos de ioga e etiqueta social no curso de formação na Escola Superior da Polícia Civil (ESPC), em Curitiba.

Nas 1.212 horas/aulas deste novo curso, que selecionou profissionais aprovados no concurso feito em 2007, são 80 disciplinas que abrangem, além das técnicas necessárias para a profissão, conteúdos para melhorar a qualidade de vida de quem vai exercer uma das profissões consideradas mais estressantes.

Entre as novas disciplinas também estão delitos financeiros, falência fraudulenta, tráfico de seres humanos, relações intra e interpoliciais, gestão e motivação de pessoas, planejamento estratégico e memória institucional da polícia.

Muitos concordam que, para diminuir a truculência e melhorar o tratamento com a população que vai atender, o policial deve, sim, ter aulas de direitos humanos e de abordagem sociológica da violência, por exemplo. Mas aprender a usar talheres e taças, além de receber indicações de lugares para frequentar, e roupas que deve usar, tem feito muitos alunos torcerem o nariz para as aulas.

Alguns acreditam que o tempo dedicado a muitas dessas aulas poderiam ser utilizadas para mais treinamento prático da profissão, por exemplo. Outros alunos discordam do exagero com que esses detalhes são enfatizados, conforme relatado à reportagem de O Estado.

De outro lado, não se pode deixar de lado que a formação dos policiais civis no Paraná é referência nacional, conforme lembra o diretor da ESPC, Newton Tadeu Rocha. “Todas as matérias são integradas para que, no final, o policial adquira a capacidade adequada para atender a população. A ioga funciona como uma válvula de escape para o alto nível de estresse e o contínuo estímulo à adrenalina a que os policiais são submetidos”, diz.

Em relação às aulas de etiqueta, Rocha explica que, em muitas ocasiões, principalmente para os policiais que forem designados para o interior do Estado, esses profissionais vão representar a segurança pública do Estado e que, desta forma, precisam saber se portar adequadamente nos mais variados tipos de solenidade que vão participar. “Há necessidade de um refinamento. O policial precisa ter elasticidade para lidar com os diferentes tipos de pessoa e, para isso, o bom comportamento é fundamental”, afirma.

Baixo efetivo traz problemas

Enquanto os novos policiais não começam o trabalho, as investigações que deveriam ser feitas pela Polícia Civil (PC) continuam enfrentando problemas pela falta de profissionais para realizar o trabalho. Uma das causas seria a demora para repor o efetivo, com concursos demorados e contratações muito lentas, segundo o presidente do Sindicato dos Policiais Civis de Londrina e Região (Sindipol), Ademilson Alves Batista.

Ele também cobra mais agilidade do governo estadual. “A partir do edital de lançamento do concurso até a conclusão do curso se passa muito tempo. Solicitamos que, terminando esse curso, já se comece outro e também possam ser aproveitadas todas aquelas pessoas que atingiram a média”, sugere.

Pelo estatuto da categoria, a função principal dos PCs é investigativa. Mas, em muitas regiões do Paraná, os policiais são obrigados a cuidar dos presos por conta da pequena quantidade do efetivo. “As investigações n&atild,e;o andam, são muitos os delegados que respondem por mais de uma delegacia e outras tantas sem equipes para investigar e buscar provas para condenar marginais”, aponta o presidente do Sindipol. Para Batista, o efetivo de policiais no Paraná deveria triplicar.

Até março, o efetivo da Polícia Civil deve receber um reforço de 291 profissionais provenientes do último concurso da categoria, sendo 48 delegados, 99 escrivães, 98 investigadores e 35 papiloscopistas. Ao todo, seriam cerca de 4 mil policiais em todo o Estado, junto com a polícia científica. As informações são da Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp).

Abertura de novas turmas

Pioneiro no País, o curso de pós-graduação da ESPC deve abrir novas turmas ainda este ano. Com o incentivo de dar subsídios para futuras promoções aos policiais, a corporação volta-se para uma outra preocupação: o reflexo da ação policial na sociedade. O diretor da ESPC, Newton Tadeu Rocha, destaca a necessidade de integrar a temática da segurança com outras áreas conhecimento, como sociologia e filosofia.

“Somos corresponsáveis pelo Estado e precisamos agregar outras áreas, pensando não só na área operativa, mas também na reflexiva”, acredita. Iniciada em 2005, a especialização em Gestão em Segurança Pública colocou a ESPC do Paraná como a primeira escola de polícia do Brasil com autonomia para treinar e certificar um curso de pós-graduação sem o apoio de universidades.

Reclamações em outros estados

As aulas de etiqueta não são exclusividade da PC do Paraná. Outros estados também oferecem a disciplina para seus policiais, tanto civis como militares. Assim como aqui, a reclamação permeia a classe policial, conforme demonstram comentários de blogs e sites da categoria na internet. Em todos, aparece a mesma dúvida sobre essas horas/aulas.

“Meu curso de formação foi de nove meses e meio, tivemos aula de etiqueta (taça para isso, talher para aquilo…), mas não tive uma aula sequer de uso de algemas”, reclama um PM de Pernambuco. Na PM, inclusive, dos conhecimentos adquiridos nas aulas de etiqueta da Academia do Guatupê surgiu o livro do coronel da reserva da PM-PR Josué Lemos da Silveira, Etiqueta social pronta para usar, publicado em 2004.

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