Tratamento de esgoto ainda é deficiente no Paraná

Se comparado a outros estados brasileiros, principalmente das regiões norte e nordeste, o Paraná tem boas condições de saneamento básico – que envolve abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos. Entretanto, as mesmas ainda não são tidas como ideais.

Segundo a última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), na região Sul 63% dos domicílios particulares permanentes urbanos contam com saneamento.

Especificamente no Paraná, essa porcentagem é de 64,3% – maior do que Santa Catarina, 60,9%, e Rio Grande do Sul, 62,8%. Na Região Metropolitana de Curitiba, são 80,8%.

No sul do País, o principal problema relativo a abastecimento diz respeito à coleta e tratamento de esgotos. Ainda de acordo com a Pnad, 67,6% dos domicílios presentes na região contam com serviço de rede coletora de esgotamento sanitário e/ou pluvial (no Paraná, 67,4%).

Nos locais em que há inexistência de redes, o esgoto vai para as galerias de águas pluviais e acaba sendo despejado diretamente nos rios. Porém, os problemas também acontecem onde existem redes instaladas. Muitas vezes, devido a dificuldades econômicas ou mesmo por ignorância, as pessoas não ligam suas residências às mesmas.

“Não faz parte da nossa cultura como cidadãos querer saber para onde vai o esgoto de nossas casas. Muita gente reclama da poluição dos rios, mas não sabe para que serve a rede de esgoto. Para muitas pessoas, é cômodo continuar jogando o esgoto nos rios”, comenta o professor do Departamento Hidráulico e de Saneamento da Universidade Federal de Paraná (UFPR), Miguel Mansur Aisse.

Em muitos locais, as pessoas ainda mantêm fossas sépticas, que resolvem o problema de saneamento em seus terrenos. Porém, mesmo essas devem passar por limpeza anual para que não transbordem e tenham sua eficiência comprometida.

“A melhor alternativa para evitar problemas é chamar um encanador de confiança e realizar a ligação à rede. Entretanto, também acredito que a Sanepar [que atende 344 dos 399 municípios do Paraná] deveria realizar um número maior de campanhas de conscientização”, avalia Aisse.

Abastecimento

Em relação ao abastecimento de água, o atendimento – de acordo com informações de 2005 do Serviço Nacional de Informação e Saneamento (Snis) do Ministério das Cidades – é de 100% em toda região Sul.

Entretanto, Aisse diz que existe uma preocupação a respeito da qualidade da água distribuída. Ela também está relacionada à precariedade da coleta e tratamento de esgotos.

“Se o esgoto não tem uma destinação correta, a qualidade da água que as pessoas bebem é afetada. Não se consegue tratar qualquer tipo de água. Chega um ponto em que a contaminação é tanta que o líquido se torna intratável do ponto de vista econômico.”

Lei pretende universalização

Não faz parte da nossa cultura como cidadãos querer saber para onde vai o esgoto de nossas casas.” Miguel Mansur Aisse, professor do Departamento Hidráulico e de Saneamento da UFPR.

Desde 22 de fevereiro do ano passado está em vigor a nova Lei de Saneamento (número 11.445/07), que visa à universalização do acesso aos serviços de saneamento no país.

Até o final deste ano, a expectativa é de que alguns pontos do texto ainda passem por regulament,ação. Entretanto, a nova lei já trouxe modificações importantes aos municípios, que têm até o final de 2010 para se adaptarem completamente a ela.

“Muitos municípios brasileiros já estão realizando renovações de contratos com seus prestadores de serviços de saneamento, revendo suas metas e elaborando seus planos municipais de saneamento básico. Com a nova lei, o setor se tornou muito mais estável e propício à organização, pois as regras que o regem passaram a ser bem mais claras”, explica o diretor de articulação institucional da secretaria de saneamento do Ministério das Cidades, Sérgio Gonçalves.

O projeto de criação da nova lei de saneamento era discutida no Brasil há mais de 20 anos. Sancionada, ela prevê que toda a gama englobada no termo saneamento seja feita de forma adequada à saúde pública e à proteção do meio ambiente.

Ela obriga as cidades a terem planejamentos municipais e regionais em relação ao saneamento básico, além de agentes reguladores, fiscalizadores e de controle social.

Pesquisa

Neste mês de outubro, o Ministério das Cidades e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) deram início à edição 2008 da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (PNSB 2008), que vai traçar um perfil bastante atualizado dos serviços de saneamento básico em todos os municípios brasileiros.

A pesquisa, que promete ser a mais avançada já realizada no setor, terá investimento de cerca de R$ 4 milhões. Serão entrevistados prestadores de serviços de saneamento em 5.564 prefeituras e responsáveis por companhias de saneamento.

“Serão recolhidas informações sobre os sistemas de abastecimento de água, esgotamento sanitário, manejo de resíduos sólidos e drenagem de águas pluviais, além de dados sobre a gestão dos serviços”, informa o ministério.
A previsão é de que a fase de recolhimento de dados termine no próximo mês de fevereiro e que a divulgação dos resultados ocorra em dezembro de 2009.

Educação e renda afetados

Quem mais sente os efeitos da precariedade da coleta e tratamento de esgoto costumam ser as populações ribeirinhas, geralmente menos favorecidas
e que ocupam indevidamente áreas de fundo de vale.

“A falta de saneamento leva a problemas estéticos e de saúde. A ingestão ou o contato com a água contaminada gera uma série de doenças, como diarréias, vômitos, cólera, hepatite, entre outras”, enumera o professor da UFPR, Miguel Mansur Aisse.

No primeiro semestre deste ano, o Instituto Trata Brasil lançou os resultados de uma pesquisa, encomendada pela Fundação Getúlio Vargas, que apontou que a ausência de saneamento afeta, além da saúde, a educação e a renda dos brasileiros.

De acordo com o estudo, as chances de morte de crianças com idade entre um e seis anos é 24% maior entre famílias que não têm acesso à saneamento básico. Já o rendimento escolar de crianças que vivem em residências desprovidas de saneamento chega a ser 30% menor. Entre os adultos, 11% das faltas no trabalho estariam relacionadas ao mesmo motivo.

O aposentado Antônio Corrêa da Silva vive às margens do Rio Atuba, um dos mais poluídos e contaminados da capital paranaense. Segundo dados da Sanepar, 11,17% da população local não conta com serviço de coleta e tratamento de esgoto.

Comprovando que os ribeirinhos são os que mais sofrem em função da falta de saneamento básico, Silva conta que se incomoda principalmente com o odor da água. “Quando esquenta, o cheiro de esgoto entra para

dentro de casa e toma conta de tudo, inclusive da cozinha. Minha casa é ligada à rede de esgoto, mas mesmo assim enfrento problemas.” Já o auxiliar de serrador Júlio Gonçalves de Oliveira, que vive nas proximidades do mesmo rio, preocupa-se com o aparecimento de moscas, baratas e ratos em seu terreno.

À reportagem de O Estado, ele contou que sua residência não é ligada à rede. Entretanto, não precisou o porquê. “A sujeira incomoda bastante. Porém, a maioria das pessoas jogam ,o esgoto na água.”