Exploração

Área onde foi flagrado trabalho escravo pertence à Petrobras

A Petrobras confirmou ontem a aquisição da área em que trabalhadores em condições degradantes foram encontrados na quarta-feira, na Comunidade Santa Fé, região rural do município de São Mateus do Sul, no sul do Estado.

A situação precária de trabalho, moradia e condições sanitárias dos trabalhadores foi mostrada com exclusividade por O Estado na última quinta-feira, durante operação do Grupo Especial de Fiscalização Móvel para Erradicação do Trabalho Escravo e Degradante na Região Sul, integrado por representantes do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), Ministério Público do Trabalho (MPT) e Polícia Federal (PF).

Ontem, após o MTE notificar a Petrobras com pedido de documentos que comprovassem a propriedade da área, uma reunião foi feita entre o grupo móvel e a estatal, na tentativa de um acordo. Hoje o MPT deve entregar uma proposta de acordo à empresa cobrando o cumprimento da legislação trabalhista naquela propriedade.

Durante o segundo dia da operação, subiu para 60 o número de trabalhadores resgatados. Eles foram retirados do local em que estavam e levados para hotéis da cidade, onde devem permanecer até que a situação se resolva. As despesas estão sendo custeadas pela estatal.

Em nota, a Petrobras afirma que o processo de aquisição das 154 propriedades foi iniciado em 2003, para implantação de uma nova mina de xisto. Em 44 delas, a empresa concordou que o desmatamento seria controlado pelos antigos donos. A nota diz que foram nessas áreas que foram encontradas as irregularidades.

“O desmatamento das demais áreas (…) ainda não foi iniciado e será realizado por uma empresa especializada e contratada especialmente para esse fim. A Petrobras reafirma que não tem nenhuma responsabilidade sobre o ocorrido e que irá colaborar com as autoridades no combate às práticas de exploração do trabalho”, esclarece a nota.

A estatal também afirmou possuir autorizações de desmatamento emitidas pelo Instituto Ambiental do Paraná (IAP). A reportagem entrou em contato com o IAP, mas não obteve resposta até o fechamento desta edição.

Acompanhamento

A propriedade deve passar definitivamente para a Petrobras em 2009. “Todo o processo de negociação foi acompanhado pelo Ministério Público Estadual, parlamentares, ONGs e associações de moradores. Foram realizadas audiências públicas para tratar das questões de desapropriação. Todo o processo de negociação foi conduzido de forma amigável e encerrado em 2005, restando apenas algumas ações judiciais de desapropriação”, continua a nota.

No entanto, essa resposta não exime a estatal da responsabilidade, segundo aponta o procurador do MPT Gláucio Araújo de Oliveira. “A autorização para derrubada da madeira está em nome da Petrobras, que repassou a atividade para outras pessoas que não estão cumprindo as exigências trabalhistas. A posição do MPT é de que eles também são responsáveis”, afirmou.

O que estava errado na área fiscalizada

1. Falta de equipamentos de proteção individual (EPIs).

2. Trabalhadores sem treinamento para operar motosserra.

3. Moradia precária, no próprio local de trabalho, a maioria em barracões de lona no chão de terra batida.

4. Ausência de chuveiros e banheiros no local de trabalho.

5. Participação de menores no trabalho.

6. Trabalhadores sem registro profissional e sem receber o pagamento, há pelo menos um mês.

7. Alimentação descontada do pagamento.

8. Ferramentas de trabalho do próprio trabalhador.

Empregador deve pagar direitos

Fábio Alexandre
Veículo da Petrobras flagrado atuando na área durante a fiscalização.

Depois de detectar quem são os responsáveis pela situação dos trabalhadores em condições degradantes, o próximo passo do MTE é fazer com que o empregador pague todos os direitos trabalhistas aos empregados. Depois de resgatados, os trabalhadores recebem o seguro-desemprego por três meses.

As multas administrativas lavradas em função das condições degradantes variam e dependem da gravidade da situação, da reincidência e do número de trabalhadores encontrados.

Há autos de infração no MTE que variam de R$ 400 a R$ 6 mil. Em muitos dos casos, os proprietários acumulam diversos deles. As ações trabalhistas e os termos de ajuste de conduta com a empresa responsável são movidas pelo MPT e, quando necessário, crimes específicos são investigados pela PF.

Neste ano, os grupos móveis já resgataram 2,4 mil trabalhadores, em 60 ações realizadas Brasil afora. “Apesar das condições aqui no Paraná não serem as mesmas da região Norte, existem condições bastante degradantes e desumanas”, afirmou o coordenador da operação do grupo móvel, Benedito Lima Filho.

Denúncias

As denúncias de suspeita de trabalhadores em condições análogas a de escravos podem ser feitas no site www.prt9.mpt.gov.br, no link “Denúncias”. Pessoalmente, as denúncias são recebidas na Avenida Vicente Machado, 84, no Centro de Curitiba.