Boas análises e um pouco de saudosismo marcam o projeto ‘Indiscotíveis’

“Livros, discos, filmes – essas coisas importam.” A frase do filme Alta Fidelidade parece totalmente sem sentido em 2015. Menos pessoas compram discos inteiros, as maiores produções audiovisuais são séries de TV e os livros também já tiveram dias melhores. As coleções Indiscotíveis, da Lote 42, e O Livro do Disco, da Cobogó, servem no mínimo como registro histórico desta forma de arte que já foi a maior da indústria fonográfica e hoje tenta um revival em vinil.

Itaici Brunetti, que organiza Indiscotíveis, escreve no prefácio de forma quase saudosista de uma época offline em que o lançamento de um álbum impactava as vidas das pessoas. É esse impacto que aparece nos textos do livro. Em uma das análises, o músico Tatá Aeroplano conta a história de como comprou A Sétima Efervescência do Júpiter Maçã. O vocalista do Cérebro Eletrônico e Jumbo Elektro conversou com Marcelo Nova enquanto ouvia o clássico disco dos anos 1990 na Baratos Afins, lojinha de Carlos Calanca, um patrimônio cultural paulistano. Ele teve que convencer o líder do Camisa de Vênus de que o rock e a psicodelia ainda eram pungentes naquele trabalho contemporâneo.

Brunetti diz que a ideia de falar sobre álbuns veio de uma conversa com o amigo e um dos donos da Lote 42, João Varella. Eles fizeram uma lista de discos que achavam importantes e saíram atrás de pessoas que tivessem interesse em escrever sobre o tema. “Os autores tinham total liberdade, a gente só teve o cuidado de ver se o álbum era realmente importante, senão a pessoa poderia falar da banda de um amigo que não tem relevância para a música.”

Além dos textos apaixonados, a coleção tem como ponto forte o acabamento gráfico. O livro vem em uma caixinha que lembra os compactos de 7 polegadas e cada volume tem o desenho com uma reinterpretação das capas originais. “Pedimos aos ilustradores que ouvissem os discos e criassem algo novo”, diz. Deu certo.

Enquanto Indiscotíveis trata de obras nacionais, O Livro do Disco mescla artistas brasileiros e internacionais. Aliás, foi uma coleção americana que inspirou Frederico Coelho e Mauro Gaspar, organizadores da edição. Enquanto eles faziam parte de um mestrado em Nova York e Filadélfia respectivamente, conheceram a coleção 33 1/3. Quando voltaram ao Brasil, começaram a buscar editoras até entrar em acordo com a Cobogó. Compraram os direitos para traduzir os livros sobre o The Velvet Underground and Nico, aquele da banana, Daydream Nation, do Sonic Youth, e Endtroducing, do DJ Shadow. Eles ainda buscaram pessoas que pudessem escrever sobre as obras nacionais. Na última hora, a função de falar sobre Lado B Lado A, d’O Rappa, caiu no colo de Frederico Coelho. “Esse é um disco que ouvi muito, mas, se fosse para escolher, eu provavelmente escreveria sobre o Aprender a Nadar, do Jards Macalé”, conta ele.

O Livro do Disco tem textos de mais fôlego. Ainda é possível ler em uma sentada, assim como Indiscotíveis, mas aqui o momento histórico da composição, bem como o background de como os compositores chegaram ao resultado clássico, importa tanto quanto a sensação de apertar o play e ser arrebatado pela música. Lado B Lado A fala de um momento específico do Rio de Janeiro, de violência endêmica e a tentativa de mudar isso. Já The Velvet Underground and Nico mostra como Lou Reed encontrou John Cale, como Andy Warhol enfiou Nico goela abaixo na banda e outras questões que extrapolam a produção do disco em si.

Mesmo analisando várias obras, o único artista comum às duas coleções é Jorge Ben (agora Jor): Solta o Pavão em Indiscotíveis e A Tábua de Esmeralda em O Livro do Disco. Frederico Coelho diz que já existe outra edição de O Livro do Disco sendo feita, já Indiscotíveis há o desejo de uma nova rodada de discos, mas sem nada concreto por enquanto. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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