Já desconfiava

“Eu ia para os morros transar com ‘veados'”, diz Cauby Peixoto

O filme de Nelson Hoineff, Cauby – Começaria Tudo Outra Vez, traz um tema sobre o qual o cantor falou poucas vezes: sua sexualidade.

Cauby diz que logo cedo, quando garoto, descobriu que o amor entre homens era perfeito, como o amor entre um homem e uma mulher. Sorri muito quando se lembra de sua adolescência. “Eu era um garoto quando ia para os morros transar com os veados. Eu também andava com eles. Transar (assim) era uma coisa natural.”

Sempre cuidadoso com suas intimidades nas entrevistas, ele fala sobre o assunto com leveza. E diz que, com o passar dos anos, começou “a andar direito”. “Depois, eu comecei a ter namoradas.”

Um dos personagens que enriquecem o documentário de 90 minutos é Tadeu, um garoto de 15 anos que vive em Olaria, Rio de Janeiro. Sua devoção a Cauby é de impressionar. E o filme vai explorar esse traço de personalidade, abrindo e fechando a história com o menino que sonha em encontrar seu ídolo.

Cauby aparece quase sempre cuidado e amparado por sua secretária pessoal, Nancy, e por seu produtor, Thiago Marques. É um homem frágil, anda em passos lentos e precisa de cuidados. E é justamente das imagens de suas limitações que sai a grande contribuição de Hoineff à história.

A voz de Cauby funciona como se fosse algo ou um ser de vida própria. Aparenta ter por volta de 20 anos a menos do que seu dono e contrasta com as limitações desse homem.

O sentimento de piedade que pode haver dos que observam Cauby se movimentando com dificuldades e cantando sempre sentado desaparece no instante em que sua boca se abre. A voz parece representar a integridade de sua alma e transmite uma dualidade intrigante entre corpo e espírito. Enquanto o primeiro vive as limitações impostas pelo tempo, o segundo pega o caminho contrário ganhando força e recursos que antes não tinha.

Cauby sofre para aparecer em cena. Uma escada de três andares pode ser para ele um grande desafio, mas sua confiança na voz que não o deixará desamparado parece ainda maior. Antes de um de seus shows mostrados no filme, há uma preocupação de sua equipe com a primeira música. Os produtores não sabem se ele vai se lembrar de que ela é Força Estranha, de Caetano Veloso. E, em um toque ao violão, ele solta a voz com uma precisão que faz entender o que segura este homem nas alturas por tanto tempo. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.