Os matizes de um jovem artista em Curitiba

Todos os dias ele sai do Alto da XV e percorre rapidamente a cidade guiado por certos deveres da profissão escolhida. Diego Marchioro desperta como um dos produtores mais versáteis do momento, qualidade que o faz encabeçar uma infinidade de projetos, nem parece que tem apenas 22 anos. Mas talvez a pouca idade seja justamente o segredo para conseguir se desdobrar entre tantas atividades distintas.

O pensamento desperto revela o porquê de Diego ter lúcida a escolha do ofício de ator e produtor. Aos 17 anos, ele – que para os amigos atende por Di – encarou o desafio de atuar e produzir a peça O longo caminho, onde iniciou a profícua parceria com Edson Bueno. O diretor foi convidado a comandar a encenação do espetáculo. Simultaneamente, o trabalho selou o contato criativo com o Grupo Delírio, liderado pelo diretor.

Hoje, os seus dias são ocupados quase integralmente com os projetos da Delírio. No momento, Diego atua na montagem Kafka – um sono mais profundo do que a morte, que também produz, ao mesmo tempo em que tenta alavancar projetos de sua própria produtora, a Rumo Empreendimentos Culturais. É lá que ele exerce a vontade de produzir outras vertentes artísticas, como dança contemporânea, música e audiovisual.

Entre um trabalho e outro, Diego sempre se permite respirar o frescor de outros ares. Por anos, esteve produzindo a desCompanhia de dança, dirigida por Cíntia Napoli e recentemente enfrentou o frio das ruas curitibanas para encarnar um travesti na peça Amoradores de rua, encenada no pátio da Reitoria da UFPR.

Guiado pela intuição e sempre acreditando nas possibilidades da concretização das ideias, Diego corre, mas não perde o prumo. O espetáculo A vida como ela é, uma homenagem a Nelson Rodrigues com adaptação e direção de Edson Bueno, estreou com sucesso em Curitiba, circula agora pelo interior do Paraná e São Paulo, e volta à capital para nova temporada em agosto.

A parceria com Edson continua na nova montagem, Metaformose, sobre a obra de Paulo Leminski. A peça, que estreia em setembro, experimenta a quebra da quarta-parede seguindo a linha de O Evangelho segundo São Mateus.

O pouco tempo livre de Diego foi suficiente para a conversa render uma infinidade de historias de um jovem artista curitibano.

O Estado: Como aconteceu sua parceria com Edson Bueno?

Diego Marchioro – iego Marchioro – Nossa parceria começou com minha carreira em 2004 e a decisão de seguir o ofício de ator. Neste ano resolvi atuar e produzir independentemente o espetáculo O longo caminho que vai de zero a ene, do dramaturgo Tchimochenco Webi. Com o texto guardado há alguns anos e muita vontade, procurei o diretor que fazia o teatro que mais me instigava. O Edson, sempre solícito, me recebeu e encontrei um parceiro que além de topar a minha iniciativa, criou um novo texto que passou a se chamar O longo caminho… estreando dois anos depois, em 2006. De lá para cá, desempenhei diversas funções no Grupo Delírio, de divulgador, operador de som a assistência de direção e em 2007 assumi a direção de produção.

O Estado: Como você concilia o seu trabalho de ator com o de produtor?

DM – Sempre produzi meus projetos. Constitui minha produtora em 2007 e concilio com a produção da Delírio, onde também trabalho como ator. São dois ofícios bem complexos que demandam muita dedicação e estudo para serem desempenhados. Me estresso um pouco, mas também tenho muito prazer em ver realizado um projeto artístico. Acompanho o trabalho desde a descrição no papel até sua apresentação ao público. Penso que cada artista deve saber gerir o seu trabalho, fazê-lo ser viabilizado e executado. Então como produtor e ator tenho a oportunidade de participar de todas as etapas de criação, produção e execução de uma obra e me apropriar de seu todo.

O Estado: De que maneira a empresa Rumo atua na área cultural?

DM – A Rumo vem com a necessidade que tenho de produzir e mesclar diferentes áreas artísticas. Já produzimos teatro, dança contemporânea, música, audiovisual e mantemos a produção da Delírio. Buscamos procurar novos parceiros e instituições para viabilizarmos os projetos, assim não ficarmos restritos apenas a editais e leis, mas também mantemos parcerias com empresas que são agentes diretos na realização da cultura.

O Estado: Como você lida com a diferença entre produzir projetos com verbas maiores e os menores?

DM – Maiores ou menores é sempre muito difícil conseguirmos os subsídios para a realização da cultura, sejam eles governamentais ou patrocínios diretos. Temos sempre que ficar ligados em editais, festivais e novas maneiras para darmos continuidade aos espetáculos. Fato é que quanto menores os orçamentos mais restrita fica a liberdade artística para a criação, busco sempre parcerias com empresas para que possamos manter a qualidade.

O Estado: Como é para você estar com peças diferentes acontecendo em um mesmo espaço de tempo?

DM – Ouvi a maravilhosa Dira Paes dizer esses dias que ser ator é ser como uma estação de trem, internamente ser ator é ser sempre um lugar de passagem. Realizar diferentes peças é um aprendizado, onde se misturam autoconhecimento, técnica e um canal direto com as emoções.

O Estado: Sua última peça, Amoradores de rua, acontecia em um espaço público. Quais as diferenças entre atuar no teatro e na rua?

DM – Vivi com o Amoradore, uma experiência completamente nova. Nunca tinha realizado um trabalho na rua e, neste caso, também sobre a rua. Me entreguei completamente a pesquisa. Uma das palavras que foram nosso lema no espetáculo foi “liberdade”, procuramos uma forma livre de fazer aquele teatro e levantar aquelas questões. A principal diferença que vejo é a possibilidade que a rua nos traz de alcance, poder me comunicar e atingir diferentes camadas da comunidade até mesmo aqueles que nunca foram a uma sala de espetáculo.

O Estado: Quais as suas influências?

DM – Cada vez mais parto de um estímulo corporal em minhas criações, as diversas possibilidades que o corpo apresenta e encadeia, a dança. A interpretação é um desafio, a influência é a vida, o estímulo criativo de cada trabalho. No teatro, Enrique Diaz, Zé Celso, Fernanda Montenegro, Cibele Forjaz, Juliana Galdino, Edson Bueno, entre tantos…. No cinema me inspiram Almodóvar, Tim Burton, Tarantino, Luchino Visconti, Truffaut, Tarkoviski e tantos outros. Na literatura, Julio Cortázar, Calderon de La barca, Teneense Willians, Nelson Rodrigues, Paulo Leminski.