Filmes fora da rota dos cinemas comerciais

Nas últimas semanas, a comunidade de capoeiristas de Curitiba começou uma série de protestos para questionar por que o filme Besouro, produção nacional dirigida por João Daniel Tikhomiroff, não estreou em Curitiba, junto com cidades do Sudeste, Nordeste e Porto Alegre (veja matéria abaixo).

E essa foi só a última reclamação sobre filmes que não chegam em Curitiba ou que aqui estreiam tempos depois do circuito nacional. Muitos e-mails à produtora, à distribuidora e aos exibidores da cidade foi o método encontrado por quem quer ver Besouro em Curitiba.

O filme não veio, mas ao contrário do que muitos pensam, isso não aconteceu por má vontade ou desinteresse dos segmentos envolvidos, mas pela estratégia em fazer o lançamento regionalizado, como acontece muitas vezes com outros filmes. “O Besouro entrou no circuito Sudeste, Nordeste e em Porto Alegre. Uma série de fatores determina isso e é diferente para cada filme. A produção ou a distribuição vai procurar atender, primeiramente, onde tem certeza que a obra vai ter uma performance interessante”, diz o programador da rede Cinesystem de todo o Brasil, Carlos Maurício Sabbag.

Para ele, a questão é simples: estratégia de lançamento. Sabbag discorda que Curitiba lance muitos filmes depois da estreia em outras capitais e diz que as produções nacionais Besouro e Salve geral (outro filme que estreou por aqui semanas depois do circuito nacional) foram exceções. “Isso já aconteceu, mas não é mais assim. Hoje Curitiba tem lançado praticamente tudo junto com o resto do País. Filmes de anos anteriores, como Meu nome não é Johnny e Tropa de elite, foram muito bem em determinados lugares e depois foram abertos para o Sul, em mais dois casos de estratégia”, lembra.

Já a permanência de um filme em cartaz depende, basicamente, da bilheteria alcançada. “Os filmes são escolhidos um a um, não há pacote na compra. A programação varia em função do perfil do público de cada cinema, mas tem filmes que vão bem em todas as salas”, afirma Sabbag.

Multiplex

A preferência de lançamentos pelas redes com grande número de salas, os chamados multiplex, é um dos entraves encontrados por cinemas menores, como os da rede Cineplus, que engloba as salas dos shoppings Xaxim, Jardim das Américas, Água Verde e Campo Largo. “É complicado. O faturamento do fim de semana é medido pelo dinheiro que entra, não pelo público. Com a chegada das grandes redes, a política de distribuição de cinema está voltada a elas”, comenta o administrador da rede Cineplus, Milton Durski.

Essa dinâmica faz com que as salas de fora dessas grandes redes recebam os lançamentos com atraso. “No meu caso, muitos filmes chegam na segunda ou terceira semana de exibição. Sou abastecido pela própria cidade, quando algumas cópias são liberadas”, explica. Na opinião de Durski, isso é interessante para a distribuidora, porque a cópia fica mais tempo na cidade. “Só que meu público tem que se adaptar e eu não faturo um terço do que o filme faturou na estreia”, compara.

Opções com programação diferenciada e reflexiva

O fechamento do Cine Luz, na Rua XV de Novembro, é sinônimo de uma opção a menos de filmes fora do grande eixo comercial para o público curitibano. Administrado pela Fundação Cultural de Curitiba (FCC), o cinema tinha, sim, problemas estruturais que acabavam por afastar muito do público-alvo de suas sessões. Mas o fechamento é temporário, garante a FCC.

Agora, espera-se que ele volte, remodelado, em novo endereço: no espaço cultural que deve existir na Rua Riachuelo, que está sendo revitalizada, segundo informações da prefeitura.

No local, devem voltar as salas do Luz e do Ritz, que também funcionava na XV de Novembro.

No entanto, promessa,s semelhantes já foram feitas em tempos passados, como para o Cine Guarani, que funcionou até anos atrás no Centro Cultural Portão. Segundo a FCC, o Guarani também deve voltar, mas sem previsão. “Houve um tempo em que já fomos um circuito exibidor importante e a tendência é que essa característica volte nos próximos anos.

Existe um projeto no qual a expectativa é que todas as salas estejam funcionando até 2012″, afirma Solange Stecz, responsável pela programação da Cinemateca e coordenadora de cinema e vídeo da FCC. “Essas salas precisam focar em programação diferenciada, em filmes mais reflexivos, um outro tipo de cinema que não está ligado diretamente a essa indústria de entretenimento. Os cinemas de shopping já têm seu público e sua estrutura montada”, completa. (LC)

A história de Besouro

Divulgação
Déa ficou decepcionado porque o filme não veio para Curitiba.

O filme Besouro conta a história de Manoel Henrique Pereira, considerado um dos maiores capoeiristas brasileiros, conhecido como Besouro Mangangá ou Besouro Cordão de Ouro. Besouro viveu entre 1897 e 1924 na região de Santo Amaro (BA), trabalhando nas usinas. Era famoso por sua habilidade como capoeirista e por ter um comportamento rebelde.

Lendas atribuem poderes sobrenaturais a Besouro, que teria o corpo fechado e a habilidade de voar como um inseto. Sua história foi contada no livro Feijoada no paraíso: a saga de Besouro, de Marco Carvalho, e adaptada para o teatro, em um musical.

Filmado no Recôncavo Baiano, em 2008, o filme tem tido boa aceitação do público e foi inscrito entre as dez produções a serem indicadas pelo Brasil a concorrer ao prêmio de Melhor Filme Estrangeiro no Oscar 2010. Da seleção, saiu Salve geral, de Sérgio Resende, filme que relembra os ataques da facção criminosa PCC, em 2006, em São Paulo.

A atriz paranaense Geisa Costa, que faz o papel da mãe Zulmira, conselheira espiritual do Besouro, conta que o filme foi o melhor trabalho que ela fez nos últimos anos. “O diretor teve muito cuidado na escolha dos profissionais, na pesquisa e no trabalho conjunto. Ficamos confinados dentro da mata, com uma excelente preparação de elenco”, conta. A produção nacional inova em trazer efeitos especiais que lembram coreografias de filmes como O tigre e o dragão.

Cópias

Ao todo, foram disponibilizadas 144 cópias de Besouro distribuídas em 120 salas de cinema do Brasil. O blog oficial do filme aconselha as pessoas que querem que Besouro venha para a região Sul para que liguem para a Federação Nacional dos Exibidores Cinematográficos (Feneec).

Para o capoeirista curitibano Luis Carlos Déa, conhecido como “mestre Déa”, a demora na chegada do filme a Curitiba incentiva a pirataria. “Como praticante de capoeira, fiquei muito chateado de o filme não ter vindo para cá”, reclama.

No próximo dia 27, grupos de Curitiba vão preparar uma roda de capoeira no Super Muffato do Portão, às 20h, para questionar o porquê do filme não estar sendo exibido na cidade. (LC)