A fria que satisfaz

“Sou fria, sim. Mas tem muita gente que gosta”, é o título da reportagem da Gazeta do Povo de domingo, assinada por Sandro Moser, mostrando “os melhores defeitos e piores qualidades” de Curitiba, com base numa extensa enquete feita pelo Instituto Paraná Pesquisas acerca dos hábitos e preferências dos curitibanos.

Quando questionados sobre o que mais gostam em Curitiba, 7,8% dos entrevistados responderam que é o clima. O porcentual pode parecer pequeno e refletir o gosto de uma minoria masoquista , mas como ressalta o texto, “é expressivo se for considerado que se trata de uma enquete espontânea, quando o entrevistado diz o primeiro pensamento que lhe vem à cabeça”.

Também entrevistado por Sandro Moser, conversamos na sacada do tradicional Braz Hotel, em plena Boca Maldita, quando num doce final de tarde (gélido para os forasteiros), confesso, matei o antigo desejo de tomar um uísque na sacada de onde Getúlio Vargas falou para o povo de Curitiba. Durante o “Farol do Saber” (uísque e gelo até à borda num copo longo), falei a Sandro Moser que “as pessoas não só adoram o frio, mas o cultuam. Existe até uma indústria do frio no Sul do país. Porém, estamos perdendo o monopólio do frio para os catarinenses e gaúchos”.

Fazendo um reparo à frase, é preciso dizer que não estamos perdendo o monopólio. Já perdemos faz muito tempo. Até os meados do século passado, os termômetros de Curitiba não perdiam para mais ninguém. Divisa do Brasil com o Polo Sul, aqui fazia tão frio que nada despertava mais a santa indignação de um curitibano como quando os jornais do Rio e São Paulo informavam que a temperatura teria chegado próximo de zero, quando na verdade os nossos termômetros, prenhes de civismo, acusavam pelo menos uns dois graus abaixo. “Uma roubalheira”, protestavam na Boca Maldita.

Entre o Paraná e o Rio Grande do Sul havia até uma velha disputa (hoje com a Serra Gaúcha disparada na frente) entre os termômetros de Curitiba e Porto Alegre. Num daqueles invernos rigorosos, um curitibano viajou a Porto Alegre. Em Curitiba o termômetro do aeroporto Afonso Pena marcava zero grau. Ao chegar, o termômetro do aeroporto Salgado Filho indicava 5 graus.

No caminho do hotel, ao comentar a diferença de temperatura, o curitibano precisou ouvir do motorista de táxi:

– Mas bá, tchê! Cinco graus em Porto Alegre é muito mais frio que zero grau em Curitiba!

Humilhação para os paranistas é saber que agora até Santa Catarina se diz mais fria que o Paraná. Como se não bastasse a perda de território para os catarinas na Guerra do Contestado, estamos perdendo também a batalha pelo turismo de inverno para a serra catarinense.

Numa cidade cujos dotes turísticos foram criados por vias administrativas, Curitiba carece de atrações turísticas de inverno. Há mais de três décadas esperando nevar outra vez, pode vir a ser bom negócio fazer o mundo saber que o “Abominável Homem das Neves” mora em Curitiba, só anda de bicicleta e é muito conhecido na cidade como o Oilman.