Lula e o abacaxi

O governo Lula bem que se esforçou para transformar o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), um volumoso rol de obras em setores vitais para o desenvolvimento nacional, especialmente nos setores de energia elétrica, transportes e habitação popular, o carro chefe da rebarbativa intenção oficial de romper com a pasmaceira dos últimos governos e colocar o País num ritmo crescente de investimentos.

A via escolhida pelo Palácio do Planalto, diante da irremediável frustração das igualmente badaladas Parcerias Público-Privadas (PPP), a ansiada salvação da lavoura na concepção dos principais operadores políticos do governo, foi o lançamento em janeiro de 2007 do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), cuja meta definida era investir, basicamente, em obras de infra-estrutura social e urbana, energia e transportes, a apreciável soma de R$ 636,2 bilhões.

A sociedade brasileira está bem lembrada de que muitos meses antes de o nome da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, ser lançado pelo próprio presidente da República no vertedouro do debate sucessório, o faro político do chefe do governo já o havia levado a pespegar na ministra a emblemática etiqueta de “mãe do PAC”, com a qual certamente esperava demarcar o espaço na base aliada para a evolução natural da candidatura da ministra. A fim de alcançar tal objetivo, a estratégia escolhida por Lula estaria plenamente justificada se o PAC tivesse efetivamente deslanchado, segundo prognosticava a exegese palaciana.

Ocorre que as coisas não aconteceram de acordo com as previsões e, no apagar das luzes do exercício de 2008 o governo informa ao distinto público que nos dois primeiros anos, o PAC somente conseguiu desembolsar R$ 98,2 bilhões de recursos provenientes da União e empresas estatais. Os dados foram liberados pelo comitê de monitoramento do Gabinete Civil da Presidência da República e revelados em reportagem publicada na edição de ontem pelo jornal Folha de S.Paulo. A União participou do total de gastos consolidados até o final de novembro com R$ 16,9 bilhões, incluindo despesas liquidadas e restos a pagar dos exercícios de 2007 e 2008. Os gastos foram complementados com investimentos de R$ 24 bilhões em projetos de geração e transmissão de energia elétrica e R$ 57,3 bilhões nas áreas de petróleo e gás natural. Pouco para quem se empenhou na realização do maior programa de obras da Terra.

O quadro mostra que apesar do esforço laudatório do governo, a mais retumbante plataforma política do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, destinada a robustecer a personalidade da ministra Dilma Rousseff com a aura de administradora capaz de liderar grandes empreendimentos, incluindo naturalmente a Presidência da República, por enquanto ainda não ofereceu o material exigido para assoalhar o caminho da pré-candidata. O desafio do conjunto representado pelo governo federal, estatais e empresas privadas é, no mínimo, atemorizante: para cumprir todas as metas previstas no PAC haveria a necessidade de realizar investimentos diários de R$ 736,98 milhões nos 730 dias restantes para o final do segundo mandato de Lula.

Com os obstáculos oriundos da tradicional cultura da burocracia estatal, evidência que o comitê de monitoramento aponta claramente no paquidérmico sistema de gestão enraizado nos ministérios, é óbvio que poucos acreditem na probabilidade da execução das obras mais importantes enumeradas pelo PAC. Auxiliares com livre circulação no gabinete presidencial, entretanto, asseguram que a tarefa hercúlea será cumprida até o final de 2010. Na avaliação de setores representativos da atividade econômica, porém, é difícil imaginar que em dois anos o governo consiga executar algo em torno de 75% das obras previstas para o quadriênio. Além disso, muitos reclamam das dificuldades de saber o que se passa na programação sustentada com recursos das estatais (Petrobras e Eletrobrás) e também por empresas privadas. Um lauto abacaxi que o presidente Lula terá de descascar.