Dentistas são contra fim do flúor na água

A Associação Brasileira de Odontologia (ABO) protesta contra o projeto de lei 297/2005, de autoria do senador Antônio Carlos Valadares (PSDB-SE), que limita a utilização de flúor na profilaxia da cárie dentária à aplicação tópica e proíbe a adição da substância na água, bebidas e alimentos.

A proposta revoga a Lei nº 6.050, de 24 de maio de 1974, que dispõe sobre a fluoretação da água em sistemas de abastecimento quando existir estação de tratamento, e está sendo relatada na Comissão de Assuntos Sociais (CAS) pelo senador Flávio Arns (PT-PR).

A entidade refuta as justificativas apresentadas pelo parlamentar. Valadares aponta a existência de dados que ?contrariam a tese de que a ingestão sistêmica de flúor é eficaz na profilaxia da cárie dentária? e que ?inúmeros outros estudos mostram também a enorme ocorrência de fluorose dentária?.

O parlamentar afirma também que ?já existe um consenso entre os especialistas de que a ação profilática do flúor decorre sobretudo de sua aplicação tópica? e que ?não faz sentido, portanto, obrigar toda uma população a ingerir um elemento tóxico na água de abastecimento público ou em alimentos e bebidas nos quais ele vem sendo rotineiramente adicionado.?

Método eficaz e de baixo custo

De acordo com a ABO, a fluoretação do sistema de abastecimento público de água pode reduzir em até 60% a incidência de cáries. As estatísticas oficiais confirmam a validade da medida. O Ministério da Saúde diz que entre 1986 e 1996, houve uma queda de 53% na prevalência de cárie em crianças de 12 anos de idade provocada pela política de fluoretação.

Atualmente, quase 27% das crianças de 18 a 36 meses apresentam pelo menos um dente decíduo com experiência de cárie dentária, sendo que a proporção chega a quase 60% das crianças de 5 anos de idade. Quanto à cárie dentária na dentição permanente, quase 70% das crianças brasileiras de 12 anos e cerca de 90% dos adolescentes de 15 a 19 apresentam pelo menos um dente permanente com experiência de cárie dentária.

Norberto Francisco Lubiana, presidente da ABO, diz que a medida é extremamente eficiente para a prevenção da cárie, a um custo inferior a R$ 1,00 por pessoa, e que sem este serviço dificilmente o Brasil conseguirá combater, em larga escala, esta doença.

?O flúor é indicado por mais de 150 organizações de ciência e saúde, entre as quais a Federação Dentária Internacional (FDI), a Associação Internacional de Pesquisa em Odontologia (IADR), a Organização Mundial de Saúde (OMS) e a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas) e, desde que seja oferecido à população em dosagens e teores adequados, não oferece risco às pessoas?, declara o presidente da ABO.

Por isso, no dia 27 de setembro, a ABO encaminhou aos senadores Antônio Carlos Valadares e Flávio Arns o Relatório Mundial da Saúde Oral de 2003 da OMS e o Relatório da FDI sobre Flúor e Cáries aprovado em 2000. Os dois documentos endossam a medida como estratégia de saúde pública de combate à cárie.

No Brasil, considera-se ideal para a prevenção à cárie na maior parte do território nacional um teor de 0,7 mg de flúor por litro, admitindo-se variações de 0,1 mg para mais ou para menos. ?Cabe as autoridades sanitárias e a concessionários locais monitorar o teor natural de flúor na água e adequar a oferta da substância dentro de parâmetros seguros?, afirma Lubiana.

OMS e FDI defendem o flúor

Segundo o Relatório Mundial da Saúde Oral de 2003 da OMS, as cáries continuam a ser um grande problema da saúde na maioria dos países industrializados, afetando de 60 a 90% das crianças em idade escolar e a grande maioria dos adultos. Ainda de acordo com o documento, ?a adição de flúor à água, onde possível tecnicamente e aceito culturalmente, tem vantagens substanciais na saúde pública?.

Em novembro de 2000, em Paris (2000), a FDI aprovou o Relatório sobre Flúor e Cárie. O documento conclui, com base em vasta evidência científica, que se a substância for usada apropriadamente e com as concentrações adequadas para a prevenção de cáries, o flúor é seguro e eficaz.

O relatório informa que a fluorose dental pode ser causada pela ingestão excessiva de flúor durante o desenvolvimento pré-eruptivo dos dentes, mas que ?nos níveis de flúor utilizados para prevenir as cáries, a opacidade ou fluorose somente ocorre numa proporção relativamente pequena da população?.

De acordo com o relatório, estes sintomas em geral são ?muito suaves? e, principalmente, ?de interesse estético?.  Conforme a FDI, ?uma vez que os níveis de ingestão sejam cuidadosamente monitorados, o flúor é considerado a medida da saúde pública mais importante para a manutenção da saúde oral?.

Fluorose dental

A ingestão excessiva de flúor (acima de 0,07 mg/kg de peso da pessoa, diariamente) pode ocasionar a fluorose dental. No levantamento nacional das condições de saúde bucal realizado pelo Ministério da Saúde em 2003, a prevalência de fluorose foi de cerca de 9% em crianças de 12 anos e de 5% em adolescentes de 15 a 19 anos no Brasil.

Esta doença acomete crianças e consiste no aparecimento de manchas brancas ou castanhas nas pontas dos dentes recém-formados. A fluorose também deixa os dentes mais porosos e pode ocasionar até a perda do dente. O fator de risco para fluorose é a ingestão excessiva e de água, pasta e alimentos adicionados com a substância.

A situação de risco pode ser diminuída pelo acompanhamento das crianças durante a escovação. Segundo estudos, crianças menores de cinco anos engolem 30% da pasta dental. Recomenda-se usar uma quantidade de pasta dental equivalente ao tamanho de uma ervilha e orientar a criança evitar a ingestão do produto. 

?Na dúvida, os pais podem sempre contar com seu cirurgião-dentista de confiança para orientá-los quanto à escovação dos dentes dos filhos e uso de produtos de higiene dental com flúor?, afirma Norberto Francisco Lubiana.

Lei não pegou

Apesar de ser obrigatório por lei em municípios com estação de tratamento de água, segundo a Pesquisa Nacional de Saneamento de 2000 do IBGE, ?a fluoretação, utilizada com o objetivo de reduzir a cárie dental nas populações, é praticada em 45,7% dos municípios brasileiros. Os maiores índices de aplicação do procedimento estão nas Regiões Sudeste e Sul, nas quais 70% dos respectivos municípios distribuem, sistematicamente, água fluoretada?.

Espírito Santo: pioneiro na adição do flúor na água – A adição de flúor no serviço público de abastecimento como estratégia de saúde bucal pública teve como ponto de partida três estudos pilotos realizados em 1945 nos Estados Unidos (Grand Rapids, Michigan, e Newburgh, Estado de Nova York) e Canadá (Brantford, Ontario).

O primeiro município brasileiro a implantar a fluoretação da água no sistema de abastecimento público foi Baixo Guandu (ES). A medida foi adotada em 31 de outubro de 1953. Até 1963, a incidência de cárie foi reduzida em 75% entre escolares de 7 a 12 anos. Em seguida, o flúor foi adotado em Marília (SP), em 12 de dezembro de 1956, Taquara (RS), em outubro de 1957. O Rio Grande do Sul foi o primeiro estado a adotar a estratégia mediante lei, em 18 de junho de 1957.

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