Projeto Geomedicina a serviço da saúde

A formulação de um banco de dados, com informações geológicas, ambientais e sócioeconômicas de todo o Estado será um importante instrumento para identificar fatores que podem ser relacionados às causas de doenças na população. Trata-se do sistema de web-mapping do Projeto de Geomedicina, que há cinco anos vem sendo desenvolvido pelo Instituto Pelé Pequeno Príncipe (IPPP) de Curitiba, em parceria com a Mineropar.

O sistema inovador do IPPP reúne um conjunto de informações advindas do estudo de amostras de rios, que podem ser usadas para fazer uma correlação entre diversos fatores do meio ambiente e a saúde da população. Com isso, é possível medir a influência de elementos ambientais no aparecimento de diversos tipos de câncer, por exemplo, e estabelecer relações de causa e efeito da etiologia de outras doenças crônicas. Este sistema visa identificar as áreas de risco à saúde humana no Estado do Paraná.

De acordo com o coordenador do projeto de geomedicina do IPPP, Bonald Cavalcante Figueiredo, o objetivo é dispor de um sistema que possibilite às autoridades de saúde e meio ambiente poder avaliar, de forma superficial e preliminarmente, se há algum tipo de associação entre o meio ambiente e as moléstias na população. “Com o cruzamento das informações, as autoridades sanitárias poderão mapear as áreas de maior influência de determinado fator na incidência de enfermidades. A partir daí, pode-se estabelecer um estudo mais preciso sobre as causas das doenças e elaborar planos de políticas públicas de combate às endemias”, afirma.

Figueiredo explica que o sistema de web-mapping desenvolvido pelo IPPP é semelhante ao sistema de busca do Google. Do mesmo modo, o sistema mostra um mapa a partir de palavras chaves que relacionam o meio ambiente com as doenças. O sistema relaciona informações de genética, biologia, química e fatores e sócioeconômicos. “Até o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) pode ser considerada uma variável para saber se quanto mais pobre é uma cidade, maior é o número de casos de algum tipo de câncer”, afirma Figueiredo.

Três anos

O pesquisador conta que o sistema do IPPP, único no Brasil, reúne informações colhidas nos últimos três anos, que são convertidas em planilhas de cores. A associação é simples: quanto mais cores, mais elevado o teor de determinado elemento. Figueiredo prevê que, dentro de cinco anos, o sistema poderá oferecer subsídios de informações nunca antes estudadas. “O sistema vai falar sozinho. As pesquisas que serão feitas a partir das informações do web-mapping poderão integrar o próprio sistema. Ao contrário das publicações de revistas especializadas, nesse sistema, as teses criam vida”, diz.

Entre as parceiros do projeto do IPPP, estão o Serviço Geológico do Brasil (CPRM) e vários departamentos da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e da Universidade Estadual de Londrina (UEL). O Projeto Geomedicina também conta com a participação de pesquisadores de outras instituições como a Embrapa, o Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP) e pesquisadores da Rede de Prospecção e Inovação para o Agronegócio no Paraná e em São Carlos (SP). O sistema de web-mapping do IPPP é subsidiado com recursos da Unidade Gestora de Fundo Paraná (UGF), da Secretaria de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (Seti).

Importância do banco de dados nas pesquisas

Fábio Alexandre
Bonald: “Informações sobre a genética da população também são relacionadas”.

De acordo com o Instituto Pelé Pequeno Príncipe, o Paraná é o estado com maior incidência de câncer de córtex adrenal em crianças. A incidência desse tipo de câncer, que aparece com maior frequência em crianças de um a três anos, no Paraná chega a 4,2 casos por milhão de crianças até 15 anos. “A disposição do sistema web-mapping é importante para encontrar uma possível relação desse tipo de tumor com uma variável ambiental”, afirma coordenador do projeto do projeto de geomedicina do IPPP, Bonald Cavalcante Figueiredo.

Segundo ele, parte das pesquisas está sendo concentrada para definir se fatores ambientais estariam relacionados com o câncer de fígado. “Neste caso, as informações a respeito da genética da população também são relacionadas.” Da mesma forma, Figueiredo conta que o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) pode influenciar no número de casos de Papiloma Vírus (HPV), que pode causar câncer de colo uterino. O pesquisador conta que o web-mapping não se restringe a um determinado tipo de informação. Segundo ele, além da análise de água dos rios, os estudos poderão ser estendidos para outras vertentes, como os animais usados para consumo humano. “O sistema pode absorver a informação de outros órgãos, como as estatísticas de casos de câncer divulgados pelo Inca ou pela Secretaria de Saúde”, diz.

Do mesmo modo, Figueiredo afirma que o projeto de geomedicina também pode contribuir para outros setores, além da saúde. Como está sendo criado um banco de bactérias e fungos, ele espera que o sistema também pode interessar profissionais da agricultura. “Nem todos os fungos e bactérias são nocivos. Se o solo é pobre, um dos fatores poderia ser a ausência de bactérias firmadoras de nitrogênio. Por isso as informações podem ser valiosas para agricultores.”

Amostras de 30% das microbacias

Em menos de dois anos, foram coletadas amostras de cerca de 30% dos 736 microbacias hidrográficas previamente selecionados em aproximadamente 80 municípios pela Mineropar. As amostras de sedimento ativo de drenagem, de lodo e água dos rios estão armazenadas no Instituto Pelé Pequeno Príncipe (IPPP), de Curitiba. Lá, os materiais são submetidos a análises químicas, geoquímicas, de agrotóxicos, bacteriológicas e genéticas. As amostras coletadas até agora são de municípios das regiões sul, centro e norte do Paraná. De acordo com o geólogo chefe do projeto de geomedicina da Mineropar, Otávio Augusto Boni Licht, foram coletadas amostras dos pontos de toda a bacia do Iguaçu médio e baixo, exceto o Parque Nacional, e da bacia do Tibagi. A localização dos pontos é feita por GPS, devido à grande distância entre eles. “Além de aferir as coordenadas, as equipes também fotografam o rio e a vegetação do local”, afirma. Quanto às amostras de lodo e água, Licht explica que estas são armazenadas em um balcão frigorífico acoplado em uma caminhonete. “Normalmente o material é congelado. Esse cuidado é importante para que as amostras possam traduzir fielmente a composição”, afirma.

Segundo ele, a intenção é detectar a presença de agrotóxico nas águas e analisar o sequenciamento genético de bactérias. As análises também visam identificar a distribuição de metais nos compostos. Licht explica que nas amostras de água são verificados o Potencial Hidrogeniônico (PH), que traduz a quantidade de ácidos e o Potencial de Oxidação. Além disso, é analisada a carga metálica da água, em Cátions e Ânions. “Um dos elementos ânions é o flúor, que, em excesso, pode corroer os dentes”, afirma Licht.

Nos sedimentos do fundo dos rios, são verificadas a alcalinidade e a presença de pesticidas, além do cadastramento de bactérias. Segundo Licht, a ideia é identificar algumas moléculas de pesticida que podem durar 90 anos. “As pessoas ,que consomem água de rios e de poços podem sofrer influência de moléculas de pesticidas usados há 50 anos. Esses elementos têm uma associação forte com câncer de fígado”, conta.

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