Comidas perigosas

Conservas e embutidos exigem atenção por causa do botulismo

Alimentos como palmito, picles, compotas de frutas, salames e frutos do mar são deliciosos e costumam render refeições apetitosas. Mas, se mal embalados, mal processados ou conservados de forma inadequada, eles podem representar um grande perigo para a saúde. Isso acontece porque esses produtos, normalmente vendidos em vidros e latas, podem estar infectados com uma bactéria chamada Clostridium botulinum, que pode provocar o botulismo, uma séria intoxicação alimentar. Essa é a mesma bactéria que dá origem a uma famosa substância usada em procedimentos estéticos, conhecida pelo seu nome comercial: o botox.

De acordo com o médico infectologista do Laboratório Frischmann Aisengart Jaime Rocha, a bactéria que causa o botulismo está presente no solo, no ambiente e na água, mas é inofensiva para os humanos se houver apenas contato com a pele que não apresenta ferimentos. O problema, segundo ele, é quando a bactéria, que produz uma substância extremante tóxica, é ingerida pelas pessoas, o que pode levá-las a desenvolver essa doença, que, apesar de pouco frequente, pode matar.

“Quando as toxinas da bactéria Clostridium botulinum são absorvidas pelo aparelho digestivo, entram na corrente sanguínea, atingem o sistema nervoso e interferem nos estímulos nervosos, resultando em enfraquecimento das funções vitais e paralisia muscular. E essa paralisia, que começa com sintomas como visão dupla, mal-estar, fraqueza, aversão à luz, dificuldade para engolir, vômitos, secura na boca e garganta, constipação e retenção de urina, pode evoluir, podendo levar à morte por insuficiência respiratória, pela paralisia dos pulmões”, diz Rocha.

Mas, para desenvolver a “toxina paralisante”, a bactéria precisa encontrar condições favoráveis. Rocha explica que a bactéria se desenvolve em ambientes sem oxigênio e, por isso, é encontrada com facilidade em alimentos enlatados ou embalados a vácuo. “Tampas estufadas podem ser indício da presença da bactéria, que costuma contaminar alimentos que não foram cozidos, carnes e embutidos, conservas em lata e vidro, doces em calda ou compota, hortaliças, legumes, peixes e frutos do mar, inclusive aquele vendidos em embalagens a vácuo”.

O perigo, de acordo com o infectologista, é a forma como os produtos são produzidos ou manipulados e não o vidro ou a lata em si. “Condições que não sigam as normas e as técnicas da Vigilância Sanitária podem resultar em alimentos contaminados pela toxina botulínica, mas felizmente, apesar de ela ser uma infecção grave, hoje, graças ao controle sanitário poucos morrem em função as complicações causadas pelo botulismo”, observa.

Toxina Botulínica: veneno ou remédio?

O médico pediatra e diretor clínico Hospital Evangélico Gilberto Pascolat afirma que a toxina gerada pela bactéria que causa o botulismo é o veneno mais potente do mundo. “A toxina é tão forte, que se a pessoa não receber o tratamento adequado, com soro ou, nos casos mais graves, com o antídoto (imunoglobulina), os músculos de todo o corpo podem ficar paralisados, por não receberem estímulos do sistema nervoso. E a pessoa pode morrer”.

E, entre as pessoas mais sensíveis à toxina, estão as crianças e os idosos. Com eles, o cuidado deve ser redobrado. “Para evitar a contaminação, é preciso tomar cuidado com os alimentos, especialmente os embutidos artesanais, conservas e o mel, evitando comprar ou ingerir produtos de procedência duvidosa. O mel, inclusive, é um dos alimentos mais afetados – cerca da metade do mel vendido no Brasil está contaminado. Mas, como, neste alimento, a bactéria não está tão concentrada, os riscos para adultos e crianças acima de dois anos são menores. Já as crianças abaixo de um ano não devem consumir esse alimento”, alerta P,ascolat.

Para confirmar o diagnóstico, o médico relata que são observados os sintomas, que incluem a dificuldade para se movimentar e que além da analise ambulatorial, exames clínicos são realizados e encaminhados ao Laboratório Central do Estado do Paraná (Lacen), para confirmar ou descartar a presença da doença. “Essa medida é importante, pois, com a confirmação, é possível identificar o produto contaminado e notificar as autoridades, para que elas façam a retirada destas unidades do mercado, evitando, assim, que outras pessoas sejam intoxicadas”.
Apesar dos riscos, como o TDelas já mostrou em reportagem publicada em fevereiro deste ano, a toxina botulínica é uma grande aliada da medicina: se usada da forma, quantidade e nos locais corretos, ela ameniza rugas, trata a hiperidrose (suor excessivo), além de ajudar médicos das áreas da oftalmologia, ortopedia e gastroenterologia a corrigirem diversos problemas de saúde, que são tratados pela paralisia muscular controlada. Isso sem contar os benefícios estéticos dela, que são ainda mais conhecidos.