O preço da vaidade

O preço da vaidade nem sempre é recompensador. Em 1ºde abril de 2010, após a Agência Francesa de Segurança Sanitária de Produtos de Saúde (AFFSAPS) inspecionar a Poly Implant Prothese (PIP) e constatar não-conformidades no gel utilizado nos seus implantes mamários, ocorreu um aumento da taxa de ruptura das próteses fabricadas por essa empresa. A partir desse fato, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) suspendeu, pela Resolução RE 1558/2010, a comercialização, distribuição, importação e utilização das próteses dessa marca.
Desta forma, embora o cancelamento do registro no Brasil tenha sido anunciado em 29 de dezembro de 2011, há mais de um ano as mulheres que receberam os respectivos implantes poderiam ter sido chamadas pelas autoridades de saúde para alguma providência. Se é indiscutível a existência de danos materiais, danos psíquicos e, quiçá, danos estéticos, também  é o fato que é prudente antes de alardear, sem critérios objetivos, que todos os portadores estão em risco.
Das 34.631 unidades das importadas no país, 30% não chegou ao consumidor e precisará ser descartada. A pergunta a ser respondida pelo Ministério da Saúde, agências do governo e médicos é o que se pode fazer para que as mais de vinte mil pessoas (por volta de 12 mil residentes no país) tenham a orientação correta sobre como proceder nesse momento, bem como de quem é a responsabilidade pelos danos advindos aos pacientes?
No último dia 11 de janeiro, a Anvisa cancelou também o registro da marca M-Implante Prótese Mamária, fabricada pela empresa Rofil Medical Nederland Bv- Holanda, uma vez que a fabricação do produto por essa empresa foi terceirizada para a empresa PIP.
No mesmo dia, a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), a Anvisa, o Ministério da Saúde, o Conselho Federal de Medicina, aSociedade Brasileira de Mastologia, e o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor do Ministério da Justiça chegaram a algumas conclusões. Foram divulgadas, através de comunicados oficiais dessas entidades, que, não há evidências que justifiquem a remoção e substituição preventiva das próteses PIP e/ou Rofil. Da mesma forma, é ponto incontroverso que todos os portadores dessas próteses colocadas, desde 2004, serão chamados para avaliação clínica nos serviços de saúde.
Ficou definido também que serão elaboradas diretrizes de avaliação, diagnóstico, conduta e acompanhamento conjunto das sociedades médicas e Ministério da Saúde do tratamento cirúrgico de substituição das próteses.
Evidente que os portadores das próteses das marcas PIP e Rofil que possuam condições financeiras de pagar nova cirurgia para à troca das próteses irão entrar em contato com seus médicos. Porém, o indicado para o momento seria o pedido de avaliação clínica pelo cirurgião, bem como uma ultrassonografia das mamas.
Chama atenção o paradoxo que sustenta a discussão vaidade versus saúde. A própria Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, a qual faz um trabalho de esclarecimento sobre as próteses com problemas, estampa as notícias de que “Misses teens ganham plástica” e que “Adolescentes aproveitam as férias para voltar as aulas com silicone nos seios”, versando sobre adolescentes que gastaram R$ 20 mil em cirurgia plástica em algumas clínicas.
Não será a primeira (e nem a última) vez que equipamentos, materiais de saúde ou medicamentos apresentam ‘não-conformidades’. Parece certo, portanto, afirmar que produtos voltados para a saúde devem carecer de mais testes e melhor acompanhamento antes de serem lançados ao mercado. Igualmente, as agências responsáveis pelo registro destes produtos (em todos os países) carecem de maior rigor no controle.
No caso das próteses de silicone PIP, já no ano 2000, a FDA (Agência de saúde dos EUA) enviou um de seus investigadores à fábrica da PIP, no sul da França, para inspecionar o processo de produção próteses e con,cluiu pela presença de violações graves no processo de fabricação das próteses. Ou seja, alguém não observou as centenas de queixas existentes na França e em outros 20 países – em que se fazia uso desses implantes – e permitiu o registro no Brasil.
Sem dúvida também todos os produtos voltados para o apelo da vaidade (e aqui não se incluem os casos de reconstrução da mama) são os mais rapidamente consumidos pela sociedade, que acredita e espera pequenos milagres da ciência na satisfação de suas doenças de alma, de algum descontentamento com o próprio corpo, ou de alguma insatisfação em suas relações sociais. O resultado pode, literalmente, custar caro, muito caro.

Sandra Franco é consultora jurídica especializada em Direito Médico e da Saúde, membro efetivo da Comissão de Direito da Saúde e Responsabilidade Médico Hospitalar da OAB/SP e Presidente da Academia Brasileira de Direito Médico e da Saúde – drasandra@sfranconsultoria.com.br
Thaís Lacerda é advogada da SFranco Consultoria Jurídica, especializada em Direito Médico e da Saúde – tlacerda@sfranconsultoria.com.br

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